quarta-feira, 31 de março de 2010

PEDRA DURA








leio meus versos e desconsolado penso
no poeta que não fui
há neles o tropeço do tempo
em pedra dura
que me atravessou o caminho
enquanto palavras primitivas
nada dizem do que sinto

estou presente entretanto à beira de meus versos
reconheço a arquitetura
e palavras percebidas uma a uma

sinto a urgência de dizer mas hesito
diante da imensa tarefa de entender


Rio, março de 2010.



domingo, 28 de março de 2010

DOS ANOS E DOS DIAS









todo dia é um novo dia
e hoje foi um dia inteiro
parte desse mistério do tempo
e março ainda nem terminou

pensei então no futuro
sem o compromisso do passado
e nada esqueci
neste implacável presente que não dura

por isso as palavras soam duras
porque tudo passa
e nem percebemos o que foi
para tornar-se mito

mas a cada gesto então
um pássaro despertava
para liberto
voar em espaço aberto

todas as coisas eram possíveis
vistas da janela de onde vislumbrei o mundo
um passado de todos os futuros
em que dias eram anos

não foi muito
mas bastou-me para entender o transitório
do dia no presente
quando cada dia
de outra forma
vale anos

Rio, março de 2010




sábado, 27 de março de 2010

O POEMA DAS PEDRAS








...se não me queres
e o que temos não basta
se me rejeitas
e o que construímos não conta
saio a recitar pelas ruas
o poema das pedras
que não se movem e não falam
que nada sentem nem mentem
que não florescem
porque não têm segredos nem verdades

não me esqueço de nada
não me despeço
as palavras que tenho são interditas
os gestos são apenas outros gestos
que se perdem de vista

dói-me este tempo
intervalo de sombras
entre o dia claro
e a noite densa

dói-me querer mais
e a certeza de não ter


Rio, março de 2010





FANTASIA "impromptus"







não quero a noite que não finda
o adeus do sol que me aquece
a solidão de anjo triste
não quero o desencanto
do sonho que acabou
do pranto que cessou
não não quero

quero o dia
quero o ritmo
quero a flauta e a melodia
quero a saudade
quero horas sem fim
à espera do perene desafio

quero a luz que de meus olhos irradia
o amor que permanece a tua espera

Rio, março de 2010



sexta-feira, 26 de março de 2010

O QUE NÃO FOI...







se a pedra que trazes um dia florescesse
se o frio olhar com que me matas incandescesse
se a palavra que não dizes me ocorresse
se o gesto que não fazes então vivesse
este nó que sufoca o grito que não dei
desataria para dizer-te que te amei

Rio, março de 2010




quarta-feira, 17 de março de 2010

CONFISSÃO





para Maria Luiza, minha mulher

em tuas mãos conduzistes minh'alma
aonde serei eternamente teu
e houvera eu ser diferente
não fosses tu a me levar
zelas por mim e me acompanhas
por onde vaga meu vagar
cuidas-me e acarinhas
o meu sentir solitário
nesse tempo em que fluistes
como água e sombra puras
terminarei onde me deixares
porto seguro no mar em que me afogo


Londres, outubro de 2008



quinta-feira, 11 de março de 2010

MAGIA E CONFISSÃO







esse time tem magia
na verdade da vitória
na raça no campo e na bola
dez que se fazem um
e se desdobram em mil
batidas do coração

é assim
caraca!
hoje foi em Caracas

rubronegro
eterno eu já sabia



Rio, 10 de março de 2010




quarta-feira, 10 de março de 2010

O POEMA






O POEMA
[uma interpretação]
um poema-teoria para Claudia Ferraro


O encanto poético é mágico
palavras que se juntam e partem
para quem as quiser receber
como os sonhos
produtos do inconsciente
para ser encanto.
Magia é o sentido de encanto
uma percepção inexplicável
um ritmo interno
que está na metáfora
nas sílabas justapostas
nos acentos e tons a perpassar o poema.
Às vezes o ritmo é forma
outras tantas é sensivelmente idéia
fundo poético
nunca é lógico
na explicação linear
nem na discussão dialética.
Prosa é razão
poesia é emoção
menos do que sentimento
uma sensação
abstrata sutil sem razão
aparente.
Inicialmente o encanto é do poeta
enquanto escreve
ao descobrir o transporte
que a palavra propicia
entre o inconsciente e o texto
cujas idéias insinua;
acaba por ser do leitor
finalmente
quem lê e recria
o mesmo texto
em outra dimensão
que é a da sua cultura
sensibilidade e imaginação.
O poema é livre
o poema voa.

Flávio Perri
Londres, maio de 2008.




quinta-feira, 4 de março de 2010







nem tão só que me renovo
se não é fé passa por ser
a vida sonhada no amanhecer
com sol luz e calor
quando sinto reviver
talvez o que novo seja amor

nada a esconder
tudo tão claro à noite cada dia
quando sou eu e o momento
do presente sem passado
de um futuro renovado

saudade do que não fui não tenho
sou quem sou
sinto o instante
suave o sentimento
e vivo sob este céu
apenas o que é meu

NYC, março de 2010



SAUDADE







os sonhos são outra coisa
nem tudo é realidade
muito lembra saudade

o tempo passa o verde seca o amor não dura
tudo é realidade
e isso é saudade

a esta altura sou eu só
a realidade o sonho
e essa melancolia

NYC, março de 2010





PAIXÃO








não sei que vida eu deixar não quero
se a que tenho ou a que sonho
e não sei qual delas vive neste verso

transitório sou neste dia claro
que o vento sopra
e a noite vem

mas a alma que encontrou prazer
não abandona o corpo incerto
em meio da paixão

nada temo enquanto existo
o tempo passa
e tudo é isto

NYC, março de 2009