quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

SAUDADE




(mensagem para a pré-festa de Natal)

não é vaga a saudade
é real
está comigo e me acompanha
nos setenta e quatro anos que vivi
dialogam comigo 
alma e coração
desde o dia em que parti

e hoje pensei neste verso
que não sei escrever
mas sei que a saudade é presença
de todos vocês em mim

Rio, 20 de dezembro de 2014

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

ANO NOVO



ao amigo Ulisses Minicucci

Pela porta por onde passa
o ano nem me vê
apenas na esperança
de esguelha sou quem crê

Rio, dezembro de 2014.


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

A VIDA




se ontem nada dizia
e hoje nada tenho a dizer
reflito
a vida é só um momento
em que pensar não é ser feliz

Rio, 2 de dezembro de 2014




segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

SETENTA E QUATRO




não é o dia que corre
nem o dia que vem
é vida aos setenta e quatro 
impaciente comigo
por nada ter a dizer

Rio, primeiro de dezembro de 2014

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

PAZ



revendo o presente reconheci o passado
de revolta diante da incompetência
à margem de Cronos carregando as lembranças
da ilusória Paz que por isso não reina 

um após outro mísseis a atingir foguetes
em sua viagem dolorida pelo espaço da destruição
do que podia ser diferente
se qualquer dos lados assumisse a racionalidade
e a dois revissem a iníqua realidade

a iniquidade está na razão humana a serviço do irracional
raciocínio de que o ataque é instrumento de defesa

será não combatendo homens que homens
soerguerão o Olimpo de seus deuses
a reconhecer sua identidade

Paz não é a torre de marfim de homens superiores
mas a liberdade entre iguais
é tempo de aprender como fazer vencer a vida

Rio, agosto de 2014

terça-feira, 5 de agosto de 2014

PALAVRAS



palavras são tão poucas
a sete chaves erram
em sete montes
no eco transtornadas loucas
tão aparentes tão presentes
progresso por vezes retrocesso
pairam no ar sem viração
ou vento que sopre o coração
ausentes palavras dos deuses vozes
tão breves a vida não descrevem
tão densas tão áridas esfinges
quantas dormem finges
a mesma vida e o destino
para entender pouco
e gritar rouco
o humano desatino 

Rio, agosto de 2014.




quarta-feira, 30 de julho de 2014

EU COMIGO



fechado a sete chaves pensando de mim para comigo

vivo...

entre os que choram há cantos
entre os que cantam tristezas 
alegrias do poder sentir e amar 
o que os deuses deram
à minha estreita faixa de visão

são vozes que me chamam
mas é tão pouco...

anos que não pedi sobrevivem aos que desejei
a que foi mesclada a fantasia do que não vivi
e o coração que sobrepuja a razão escuta e sofre
da alegria de estar aqui

ainda...

esse é meu pátio de milagres
a que olho com olhos razos
feitos puros da beleza 
do que vejo

há vida... 

tão breve o tempo
tão não sentido
o que resta é quase hoje 
nada...

Rio, julho de 2014

sábado, 26 de julho de 2014

SEM MAIS




nunca maior nem menor 
o homem sobrevive mal a seus desatinos
competindo com os deuses
mata-se cumprindo seu destino

um após outro anos após anos
não lhe bastam os males corporais
insistem conscientes
em seus males morais

pouco importa o outro homem
mulheres ou crianças pouco importam também
na diversidade todos iguais 

a ressaca arde ao fogo do ódio
sobrepõe-se à Paz implorada
matam-se sem mais 

Rio, julho de 2014.

quinta-feira, 24 de julho de 2014

TANTA VIDA (complemento)


[complemento de um poemeto de janeiro de 2010
 - "TANTA VIDA"]





...tanta vida fugindo de meus olhos
tantos olhos postos em mim
nem tantos olhos nem tanta vida
contam o que sei assim


Rio, julho de 2014.


domingo, 6 de julho de 2014

SAUDADE



o tempo circunstancia
o espaço distancia 
a saudade que é sombra da verdade que se fez

a realidade segue o real que a imaginação tangencia
no coração os deuses continuam presentes
na expiação do pecado
capital 
de não haver juntado espaço e tempo

sofre ao Sol perde a Lua
idólatra do passsado
a saudade só

é presente sem futuro
múltiplo de si mesmo


Rio, 06 de julho de 2014



terça-feira, 10 de junho de 2014

SER


não é difícil entender laços
afetos em plena liberdade
mais difícil é compreender o tempo
ou o sonho um a cada vez

viver não é segredo quando se passa à ação
e se permitem os laços entre sonhos e ambições
e tudo mais que os humanos anseiam
no jogo de jogar a própria vida

é sempre tempo de começar
sem o constrangimento das situações
de pedras que se alevantam no caminho

basta a liberdade de ser e o direito de sonhar
basta o entendimento de que somos mortais
basta fazer do tempo uma incógnita a favor

viver não é segredo quando se tem a coragem de ser


Rio, junho de 2014




segunda-feira, 21 de abril de 2014

O AMOR


a consciência do amor é lúcida
encobre defeitos cria novos seres
nada deseja e a tudo anseia
tudo o mais é resto
escolho do que lúcido se importa

hesitante espera mas não cede
entrega-se ao amor
e dele vive
é eterno porque dura
e duradouro guarda em si o universo
do amor sem conta 

Rio, 21 de abril de 2014


domingo, 30 de março de 2014

HESITAÇÃO



derrama-se o mar de madrugada 

águas vêm e voltam
sobre a plácida praia
imaculada
movimento da hesitação 
que é vida

Rio, março de 2014.



domingo, 23 de março de 2014

UM HOMEM



insubmisso
o homem não se curva ao vento
o homem não se curva à chuva
não se curva ao gelo do inverno
nem ao calor asfixiante do verão 
sobrevive à própria consciência 
que o perturba
que o absolve ou condena

sozinho
esse homem trás em si a força de ser 
inquebrantável força 
supera o que o ataca 
ultrapassa os limites dos anos
nunca se abate
e avança para  mudar seu destino
para não se arrepender depois
do que poderia ter sido e não foi

apaixonado recomeça com novas ideias
nunca estrangeiro a si mesmo
abre as janelas da vida
para apurar o conhecimento do mundo
e recusar o medo
que as coisas humanas trazem para assustar-nos
e descansa por haver escolhido o caminho
o único caminho atento
para tudo entender e nada esquecer

esse é um forte.

Rio, março de 2014.

sexta-feira, 14 de março de 2014

DE MINHA JANELA

da janela vejo o mar aberto
e um ângulo de praia
ilhas ao largo 
amarras
que dão vida à eternidade

faz sol (quase o tempo todo)
e tempestades no verão

sopra a brisa sudoeste
úmida a areia nova
penso em ti tal como Caieiro

tu me trouxeste a natureza
e a beleza

dias e noites costuram-me à vida
alegrias e tristezas
só minhas por amor talvez platônico

e tu oh sol
aquece a dor e o prazer
para alongar sob o céu azul
padrões de minha solidão

não troco minha Ipanema por nada
traz-me paz e garante o desejado fazer nada
desfila ali a meninada
sarada

que mais desejar na vida longa
o "brouhahá" alegre da praia
a noite calma
e o silêncio do ir e vir suave 
do mar a derramar-se 

Rio, março de 2014.

VELEIRO


quero um veleiro para navegar o vento

e velas brancas para alçar meu vôo

levo a memória comigo do azul em branco

nuvens  flutuantes sobre gaivotas

nada terei em mãos

exceto a prece de alguém sonhando
com mar e céu descrevendo a vida

Rio 14 de março de 2014.


quinta-feira, 13 de março de 2014

GAIVOTAS ILHAS



é sonho ainda quando o amanhecer dourado
destaca o verde recobrindo a pedra
diante de meus olhos
ilhas

o mar azul as cerca de grisalhas cristas 
à distância sonolento desperto
com a visão de velas brancas
gaivotas 

em Ipanema é dia 

Rio, março de 2014.


   

PEDRAS



meus olhos estão cegos de tanto ver
o deserto de pedras

onde está a cerca a definir limites

sinto a suavidade de teu olhar
que pode ver o infinito  
e revelar que sonhas

só há mistério onde não há sentido

a distância que nos separa no tempo é o limite
o sensível tornado insensível
em tuas pupilas fotográficas

quanto te olho e não posso sentir teus sonhos

só o deserto de pedras reflete o que vejo
e sobrevém o suspiro
lacrimosamente

Rio, março de 2014.


quarta-feira, 12 de março de 2014

CICLO


passo a porta do tempo
esqueço meus sonhos
encerro a memória dos fatos
e não me conduzo
deixo-me ir

penso nisso e em suas circunstâncias
não sei se compreendo
é só um mundo novo
valerá a pena vivê-lo
e trabalhá-lo como um jardineiro com as plantas
semear fazê-las vingar

se esqueço meus sonhos
crio novos

e a lua brilhará 
refletindo a luz do sol
depois de deixar sua órbita e voltar 

tudo novo 
tudo por explorar
na permanente reconstrução 
em seu ciclo universal

Rio, março de 2014.






sexta-feira, 7 de março de 2014

A PEDRA E O TEMPO



o que sente a pedra sobre o tempo
presente passado futuro
perplexa  
enquanto nosso tempo passa
e neuroticamente o medimos
segundos minutos horas
numa só e inútil ilusão

assim admirando a pedra
fico
o meu tempo é um compacto pétreo de tempo
desestimula como sonho o futuro
funde fatos do passado
e se esse é o nome do jogo 
é presente

São Paulo março de 2014.

quinta-feira, 6 de março de 2014

VIDA



amo a janela que se abriu há setenta e tres anos
loucamente sorvi o sabor e o perfume do que vi
sei que é longo e que o tempo corre
mas ainda vivo a alegria de existir

São Paulo, março de 2014


sábado, 1 de março de 2014

POEMA INÚTIL



um dia qualquer numa manhã qualquer
um longo rio há de chegar a sua foz
terá sido a realização do mistério da vida
um segredo da natureza
tais que a árvore o monte a planície de que fala Pessoa [Caieiro]

"let's go home" dirá quem me virá buscar
porque escrevo na inútil tentativa de ultrapassar esse momento
e deixar algumas palavras por vezes preenchendo idéias
para uma posteridade ambiciosa mas perplexa
porque não poderá ser verificada

a casa que me está reservada terá um só cubículo
dificilmente habitável
mas destinado a quem viveu ilusões
e doravante não poderá ultrapassar
as quatro paredes sem janelas
de onde não verá o dia nem a noite
só o tempo
que não se medirá

hoje falo comigo também
na penúltima esperança de ver o outro lado
a margem esquerda
mas ninguém se importa com o desaparecimento 
da minha frágil e tentativa ponte
entre duas margens das quais uma só conheço
desse rio que seguirá seu caminho

tarde atribuí-me essa tarefa
como quem constrói essa ponte
entre hoje e amanhã
mas não haverá amanhã exceto para muitos
que não se interessarão pelo que escrevi
a ponte incompleta cairá em ruínas
o rio chegará à foz envolvido pelas águas de outros rios
desconhecidos rios frígidas águas
claras ou poluídas
e o caudaloso rio de outras vidas
ocupará o vazio

Rio, fevereiro de 2014.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

SEREIA

sempre esperei uma sereia
na pedra do Arpoador
viria do mar, esguia, olhos azuis

não há razão que impeça uma sereia de vir
a brisa do sudoeste às vezes é vento
a brisa é úmida e o vento seco
se a natureza fosse perfeita
uma sereia não seria uma metáfora
mas parte do mundo natural

anos atrás eu pensei ver uma sereia
golfinhos quando as ondas grisalhas chegavam à praia
e eles traziam alegria
mas nenhum deles tinha a beleza de minha metáfora
e eu continuo à beira mar
junto das pedras
escrevendo minha canção de amor
apaixonadamente

Rio, fevereiro de 2014.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

UMA NOITE SÓ


são ondas do mar
são apenas ondas do mar
a música que ouço repetida mas harmônica
um som suave vem e vai
que se repete com as gaivotas
em seu vôo circular

sento-me sobre a areia úmida da noite fresca
dispo-me do próprio ego
e deixo-me sentir
que neste verão de calor pouco usual
o frescor da aragem alimenta-me
e me reconforta

um clima de serena madrugada
ajuda-me a sonhar
e talvez entender
a monótona linguagem do mar
que me penetra em forma de solidão

ponho-me dentro de mim
e sinto o sincopado pulsar do coração
isto me acalma
e me alia à palma nunca subjugada pelo vento
mas sensível quando se inclina

ninguém em torno ninguém por perto
sou um homem são em busca das sensações
de cada tato de únicos sons
isolado e feliz como o Argonauta
em busca das emoções verdadeiras [Caieiro]

são apenas as ondas do mar
a música do suave marejar
a guiar as gaivotas
na aragem bem vinda de uma noite 


Rio, fevereiro de 2014.

REAL E SONHO



sonho e realidade
instâncias de uma mesma vida

quando tem sol brilha o sol
quanto chove torrencial a visão é cinza
ao abrir a janela
ao fechá-la

quem sabe a verdade de cada um
com seus próprios olhos
e próprio toque de mão
quem sabe

durante todo o dia
uma flor executa uma cantata de Bach
fruto de sua memória
ouço um cello por vezes soturno e grave
quem sabe não somos donos de nossos ouvidos também

penso e escrevo

do mais puro sonho volto-me para a realidade
são duas horas da manhã
não vejo fora de minha janela a fonte
límpida de água pura
tão comum em Roma

alguém está cego
eu ou a fonte
mas a água é fresca
eu sinto isso

uma gaivota sobrevôa  o mar escuro
não a vejo mas ouço
o que é real o que é sonho
nunca saberei 

e sem planejar
indisciplinadamente
inclino-me em respeito à Criação

Rio, frevereiro de 2014

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

SER POETA



nem alegre nem triste
poeta (Cecília)

penso-me às vezes que ser poeta é interpretar
o fato além do fato
a sensibilidade além da emoção
a alegria antes que se instale
a tristeza quando tem de vir

como Pessoa (Caieiro) amo a natureza
sinto o perfume das flores
como percepção que está entre mim e a flor
uma certa mística
em ver uma pedra no meio do caminho
(Drummond)

nem por isso sou poeta

Rio, fevereiro de 2014.


domingo, 23 de fevereiro de 2014

VISITA INDESEJADA


circula sorrateira
não ousa tocar-me
estou fechado a suas tentações
e não é o tempo

nem todo dia chove
nem a bruma escurece o caminho
mas a indesejada vem
e cheia de mistério diz
"'e tempo, é quase tempo, esteja preparado
em pouco tempo venho para levá-lo"

pensei como quem pensa
na beleza da noite 
das estrelas cintilantes
e lua cheia
pensei na aurora quando o sol desponta
no poente que despede o dia
e vem a noite bela

dia quente de verão
a brisa lânguida aquecida lambe-me a face
mas pensei na beleza 
que é flor montanha natureza
e mar aberto
pensei materialmente nisso

sem tempo de ser gentil educado agradeço
enquanto penso no que lhe dizer
(é preciso de vez em quando ser indeciso)
para ganhar tempo

pedi tempo
e a indesejada foi-se

Rio, fevereiro de 2014




sábado, 22 de fevereiro de 2014

MINHA CASA II


minha casa tinha janelas vermelhas
e era caiada essa minha casa
uma varanda pequena coroada de uma trepadeira 
que chamávamos primavera
é eterna essa primavera
porque eterna é sua lembrança em minha memória
para mim a casa era grande
largo era seu jardim onde meu pai plantou rosas
essa casa me faz pensar
da importância que ela tem pra mim
e assim porque sinto
essa casa será sempre minha
ninguém a tomará de mim

Rio, fevereiro de 2014.





POSEIDON


Poseidon domina os mares
o oceano é feito de ondas
que balançam embarcações
e as perde em sua imensidão
onde está poseidon no mar
não há domínio dos mares
só há mar e ondas no mar

Rio, fevereiro de 2014.


sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

ESTRELA DA MANHÃ



há uma só gaivota no ar
na quietude de seu vôo solo
é despertar da aurora

foi educada a voar nestas paragens
a partir das seis horas da manhã
em circunvoluções aparentemente sem lógica

mas ela é uma precursora
localiza cardumes que navegam sua inconsciente viagem
entre nuvens de peixes inocentes

olha o horizonte e vê os sinais que lhe envia o vento
mede a distância com a precisão do olhar
montanhas previsíveis a estibordo

vê um tênue arco-iris à distância
bonança a bombordo
suave a planar
uma curva longa à direita

havia apenas uma estrela no céu

Rio, fevereiro de 2014

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

POENTE


ontem dediquei-me a olhar o poente
e assim deixei-me olhar
o horizonte dourado
arco-iris inesperado
ambar dominante
pleno de eternidade

Rio, fevereiro de 2014.




segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

MAR DE IPANEMA



meu mar tem a quietude de sua beleza
dia vai dia vem
meus olhos o admiram atento
mar de Ipanema
ouço-o a murmurar
e encantar as manhãs 

se às vezes me apaixono
não me apego a Vinicius
ou nem mesmo a Platão
de verdade falo comigo
fundo no coração

o mar de minha praia
não tem feitos heróicos
tem pedras e areia fina
que se perfilam até ao Arpoador
tem namorados enamorados
apaixonados como eu me sinto
a viver e não pensar nisso

Rio, fevereiro de 2014

MORAL



bendita a civilização

que faça de cada homem um templo
de respeito ao outro
de entendimento
de mútua atenção

bendita a educação

que nos faça sensíveis
culturalmente visíveis
respeitosos da natureza
da arte criada
serenos amantes um do outro também

o compromisso  social

ensina-nos a responsabilidade
direitos e obrigações
política e moral
a cumprir nossos deveres 
e a sermos pontuais 

benditos sejam os homens

(e as mulheres)
que assim
sejam iguais

Rio, fevereiro de 2014


SAUDADE II



quando eu fui criança
inocente e gentil
aprendi com minha mãe a dizer obrigado
com meu pai geografia
com os meninos de rua
a ser feliz

fui menino 
não sei se fui compreendido
mas a pracinha do outro lado
vista a cento e oitenta graus
floria e eu amava
estar lá

cresci na casa de vidro
e sua janela ovalada
era rapaz e tanto bailei
com minhas namoradas
que era vez por outra outra
mas para mim sempre a mesma

ah como é bom ter vivido
esse mistério da vida
e um dia caipira
ver meus filhos crescidos
bem educados
falando francês e inglês

ah que saudade que eu tenho da aurora da minha vida

Rio, fevereiro de 2014

SAUDADE



a casa em que vivi está lá
com suas janelas vermelhas
e a primavera florida
cercando-lhe a varanda
encantando quem a vê

há lembranças que me enchem a vida
como a pracinha defronte
e sua rua larga
distanciada por alas de "flamboyants"
esconder-se não havia onde
mas brincávamos de pique-esconde

a casa (creio) ainda está lá
e eu setenta e três anos a sonhar
a cada dia mais volto p'ra lá

Rio. fevereiro de 2014.


domingo, 16 de fevereiro de 2014

TRISTEZA E ALEGRIA



não sou alegre nem triste
diz a poeta com razão
tudo é coração
tristeza não vem de fora
alegria não se alcança com a mão
nem morrer que é continuar se consegue no feirão

é um engano
ledo engano
tomar a tristeza por mão
tanto quanto encontrar alegria no chão

alegria e tristeza são coisas do coração

Rio, fevereiro de 2014

sábado, 15 de fevereiro de 2014

EMOÇÃO



a linha do horizonte 
é fímbria entre mar e céu
azul com azul em tons 
que um ao outro  complementam
sopra a brisa  

da areia fresca [é noite]

úmida da última onda
dispenso-me a agitação
e deixo falar o coração

e ouço-o 

sozinho sou emoção
fora de mim nada passa
sou apenas a emoção 

Rio, fevereiro de 2014


O MAR E A PEDRA COMIGO



sentei-me na areia fresca da noite
e deixei-me sonhar
era quente o ar
constelados os céus
o silêncio quebrado
pelo marulhar

pensamentos perdem-se no seu vem-e-vai
como a onda do mar
que se derrama inteira
sonda
e retira-se descabelada
sem nem mesmo decidir

é verão aqui
quente sobre a pedra
fixada há milhões de anos
e eu
episodicamente a namoro
por um átimo em sua longa vida

penso e deixo de pensar
entre o marulhar e o silêncio
capto o silêncio e deixo ao mar a mensagem de amar

Rio, fevereiro de 2014

ONDA



derrama a onda espuma pela praia
penúltimo esforço de entender-se
antes de morrer ali frágil e desgastada

penso em algum sentido
que não capto
do deixar de ondear o prata da Lua
o céu constelado
vestida simples de branco cabeleiras rotas
e secar consumida pela areia
onde restam poros
e pés gravados no caminho incerto
de quem passa

Rio, fevereiro de 2014



sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

VENTO


sopra por sobre o mar
o vento 

vento 
ouço-o zunindo às noites
sinto-o presente desde o sudoeste
vento
perde-se  sobre as ondas
deixando rastro e maresia
venta
lambe meus ouvidos
arrepia-me
violento

há sons diversos no vento
que me escapam
salvo a música
que me dá alento
venta

o vento à distância
ainda sopra em pensamento
atrás do sentimento
venta 

Rio, fevereiro de 2014

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

A PEDRA E EU


penso
quando é dia
sinto
quando é ficção 

uma pedra o que será
pergunto
entre as duas percepções

mas enfim a diferença
se penso e a pedra não 
está entre ser eu e não pedra

dura milênios a pedra 
em silêncio
não duro tenho pena
vou

Rio, fevereiro de 2014.


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014



passei a tarde a olhar a pedra 
dos "Dois Irmãos"
havia a pedra o céu azul e o silêncio 
soprava o vento
só o vento sobre o penhasco
e o céu azul

Rio, fevereiro de 2014.


AMBIÇÃO



sou aos setenta e poucos anos ainda
quem vive intensamente

penso mas não imponho pensamentos
escrevo embora crítico de mim mesmo
estou desperto em plena noite
sonho no sono vespertino

sonhos sono pensamentos
enfim pouca diferença 
vivo o momento (e memórias do que fui)
lembranças menos tendem a enternecer

o mar busca o céu na curva do horizonte
fascina-me em sua grandeza e ambição
está bem no seu vai e vem
bravio murmurante terno eficaz

o tempo esvai-se tornando intensas sensações
pressinto-as sinto e as quero mais
não saberia contornar sua desambição
se raso e seco levem-me também  

Rio, frevereiro de 2014.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

VIAJANDO


faço a mala e deixo correr o tempo
sei que o caminho é curto
e que viajarei
mas de onde para onde
vai esse trem

pouco importa não me exaspero
o embarque está garantido
só o tempo engana
quem enganado está com um pouco mais
ou pouco menos

a aceitação me toma
sobre a intensidade dessa ida
num verão transparente e seco
ou no outono prenunciando a primavera
um pouco mais
e a excitação de encontrar outra solidão

não durmo mal por isso
sou sempre o mesmo sonho breve
de sonhar repetidamente presente a indesejada
no abraço de participação

Rio, fevereiro de 2014.



segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

OURO E PRATA



brilha o poente no dourado sobre os céus
um ritual de encanto e sedução
como janelas de vida em projeção

o movimento pendular do astro rei
são o abraço do astral a relembrar
cem anos ainda por viver

à noite e tranquila madrugada
sussuram as ondas do mar
o seu canto repetido de amor

nas noites de luar beija a lua
em prata fresca a brisa de amar


Rio, fevereiro de 2014.


ADIANTE!



tudo que responde é vida
o desejo de estar vivo
aquela sensação de que há muito diante de mim
adiante de mim

quem me dera saber mais do pressentimento
medido e escalado 
como retomo o sentimento
sentido e lembrado

não
não sei se a imaginação tarde da noite me acorda
ou me engana
não estou seguro de que o sono interrompido
canta para me acompanhar 
como o sopro do vento
à beira da estrada tange a indiferença
ou o desejo de ser

sou devorado pelo pensamento
que me varre certezas
e derrota o que já foi
para indagar o que me vem

há diante de mim vida
adiante
isso me importa

Rio, fevereiro de 2014.




domingo, 9 de fevereiro de 2014

JANELAS DA VIDA



janelas abertas para a vida
diálogos de alegria com o mundo circundante
é madrugada e o sono infante
inspira sonhos claros
assegurado o céu tranquilo
de azul intenso entre nuvens brancas

o sonho mistério traz visões tão simples
desperta-me na noite escura
para ajudar a compreender a vida enorme
que a psicologia interpreta sem razão

o vento sopra cenários de dentro para fora
e sinto escrevendo um poema
a lembrança que é memória e diz que há tudo ainda
por viver embora

janelas abertas para a vida é a sensação que se esconde
em meio ao esquecimento de viver 
frágil ainda neste estágio

o sono o sonho dialogam comigo
o som macio da maré em frente que se desdobra calma
é madrugada de verão


Rio, fevereiro de 2014.



sábado, 8 de fevereiro de 2014

O ENCANTO



amo a vida 
cruzei-a sem pensar no tempo
como talvez faça a gaivota flutuante 
o seu branco imaculado dançarino sobre azuis
assim no espaço abstrato 

dialogo com a memória
ou lembranças fugidias talvez

vivi porque nasci
nem soube como me foi dado o prêmio de nascer
onde e como
quanto pressentimento
quanta voz cantei
para tentar ouvir o mundo
mirando-o no vôo solitário

como é sonhar 
sempre indaguei em pleno sonho
dos momentos entre a aurora e o poente
como é sonhar o sonho da noite escura 
perguntei-me
no uso pleno da razão

tenho respostas sensíveis que não pretendo desvendar
o sonho de meu fado
e o destino de quem me suceder

tenho indagações nem sempre inquietas sobre quem sou
ou me tornei

amei intensamente meus amores
quem me acompanhou
quem me acompanha
quem de mim resulta ou resultou
quem pude formar segundo a percepção
da experiência vivida
da emoção pressentida
um resumo de existir 

como um relâmpago tudo se esclarece por um instante
no escuro do entendimento
quão sem sentido é o espaço e qualquer medida do tempo
perdidos entre estrelas e planetas
a colidir por vezes com o mal
tentando convergir com todo bem
difícil a opção
certeira a pretensão

tenho a saudade de tudo
onde se encontram as almas
uma certa inveja da esperança
que nem é nem dura
mas persiste

vejo à distância a revoada do branco
que se confunde no horizonte 
na estreita fímbria entre o céu
e o mar presente

esse é o encanto

Rio, fevereiro de 2014.