segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

SAUDADE [de novo]



uma saudade abstrata toma conta de mim
uma ausência como o vazio sideral
sem gravidade que atraia
sem mesmo ar pra respirar


aqui da janela de casa
ouço o mar
ondas se derramam na areia
e se recolhem pra trás


abstraio-me


longe do mundo desejando vida
não te podendo encontrar


Rio, janeiro de 2012.





domingo, 29 de janeiro de 2012

REVIRAVOLTA





estar só me acalma
mas sou feito pra a vida
muita estrada me fascina


a liberdade do mar
dos roteiros que não há
nem o horizonte me obriga
nem céu tem tábuas da lei


escolho o amigo
afasto quem não me quer 
uma emoção diferente
é sentir falta do ausente


pobre rico remediado
nada importa mas o humano
o pensamento que vale
o sentimento que traz


gosto disso no boteco
em sua desordem aparente
deixando o tempo passar
e a conversa encantar


futebol no Engenhão
na grama ou campo sintético
é seguramente paixão
em busca do que nunca fui


a praia de ninguém
derrama-se para ensinar
democraticamente
o que se aprende em viver

 essa que me conduz
à liberdade e caminhos
é "música do povo" [1]
que me domina e seduz
                                                                                                      
trezentos e sessenta graus
uma volta completa
para recomeçar
o que atrás eu perdi


é emoção diferente
não me perguntem como ou porque
tendo o banquete nas mãos
escolhi arroz farofa e feijão

na terra o rio que passa
faz seu caminho pro mar
conhece ritmado e sereno 
o caminho certo a tomar



  assim navega meu barco
                                                                                                        meus versos são meu roteiro
                                                                                                        sonho com a eternidade
                                                                                                        tempo que não terei





Rio, janeiro de 2012.

[1] Fernando Pessoa





sábado, 28 de janeiro de 2012

PERGUNTAS INDISCRETAS



[...em busca da identidade...]


hoje pergunto o que não me responderás
como vives quando não estás comigo
o que fazes
que direção tomas
qual o lado em que estás
quantas palavras usas 
quantas para comunicar-se
poucas
e os gestos para enfatizar
e tentar entender
muitas palavras
ou algumas para desentender


falas na busca pessoal de encontrar
a quem queres 
a que horas dormes
e acordas
dormes só
adormeces ao deitar 
ou busca a costela ao lado para recostar-se
e não dormes mas refolegas
na ilusão do amor
que o prazer dá


pergunto pergunto pergunto
não me cansarei de perguntar
porque é difícil a solidão
e muito remoto o esforço de comunicação


a outra pessoa é o outro
aquele cuja vida vivida desconheces
céu ou inferno
no ideal que seria conviver
e intensamente conhecer
a verdade íntima que nem é sua
nunca será
é do outro
mas psicologicamente
afetivamente
completa o sentido de viver.


Rio, janeiro de 2011.





sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

BEETHOVEN



nem armas nem barões assinalei
quando cantei


mas advirto
o que vi de fora
não me habita
dentro


alegrias tristezas 
nada ficou para cantar
em palavras que um sentido tivessem
de mágoa talvez
para entender-me


pensei em mim mas não cantei


se quiserem
meu canto será parte do que sou
espreitando o que fui
ou não 
num momento


só é meu porque o escrevi
mas não me encontrei
nem me perdi


não sinto meu canto
percebo o instante 
mas não o direi alegre 
nem triste


há o tempo
esse fantasma impalpável
amores há
entre tantos dissabores
dores poucas


ah e a lembrança


talvez por isso a saudade discreta
está presente em silêncio
no abstrato de ser
o que não sei


canto a percepção 
mas não me sinto 


como Beethoven não ouço
e não sendo Beethoven
não crio


Rio, janeiro de 2012.




QUEM SOU?





sei que nada sei de mim
o que sou não saberei
não me sobreviverei


o tempo passou
o dia se foi
as estrelas dispersas
parecem vazias
não sei o que sou


vou-me de instante a instante
em busca de mim
nem um passo além
nem gestos aquém
não sou ninguém


quem sou entre tantos
talvez
sombra do que pareço
quem mais eu serei [?] 


pedra polida
apenas o vento
ou gotas de chuva
resvalam em mim
não sinto meu canto


....................................................................indago quem sou


Rio, janeiro de 2012






VERDADEIRO FALSO




se em sonho vives
de teus desejos sobrevivo



tens em mim o efeito 
fantasiado travestido diluído


entre o sonho e teus desejos
o poema passa
como brisa que refresca a alma
e me faz feliz



tudo o mais é falso
nunca é o que é


Rio, janeiro de 2012.










"O FIM DE TUDO"



"...eu canto porque o instante existe [...]
 não sou alegre nem triste, sou poeta..."
Cecília Meireles




a melancolia não é gozo 
vem da alma e nada diz


não é o fim de tudo
não renega o futuro
não desafia o presente
e o passado não vê


basta o amor incompleto
o resto é abstrato


parece qualquer coisa hesitante
entre o sono e o sonho


chora por existir
ou por exasperadamente rir


a melancolia é a dor do momento
não a tristeza final



Rio, janeiro de 2012.

[a propósito de um comentário anônimo sobre VERSOS ILUSÓRIOS]




quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

VERSOS ILUSÓRIOS



o tempo não reteve a hora
nem guardou os dias
de que me lembro
tudo tão breve
para um homem perplexo
que vê os anos caídos em folhas
sutilmente amarelas 
dissipadas


é exuberante em desejos o fim
como o sol que se põe 
iluminando de vermelho
as nuvens mais altas
testemunhas do astro 
irredento
ao fim de seu dia


não é a noite que amedronta
mas a ausência do dia
a melancolia do que perdi
o amor como ramo debruçado
sobre a margem de um rio
molhado ainda
choroso
pelas águas que passaram
no seu irrepreensível caminho
em busca do mar


eu me sinto assim saudoso
feliz de mais um dia
esperançoso
do que virá


estes versos ilusórios meditam para entreter
limpos e frios na madrugada silenciosa
a saudade que de mim tenho
em tempos outros que não voltam mais...


Rio, janeiro de 2012.






segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

O DESTINO DO POEMA





o poema é um salto no escuro
pode luzir 
como fogo fátuo brilhar
mas se no fundo bater
ninguém saberá que existiu




Rio, janeiro de 2012.





domingo, 22 de janeiro de 2012

Poema de um jovem amigo [19 anos]

Fausi Kalaoum


Eu sou feito de camadas, cascas e cascos
eu sou hostil 
uso espinhos, pedras e até palavras para ferir
e meus alvos ? ah ! São mais de mil 
menos que uma infinidade
eu sou selado de ironia, maus olhares e veneno
e se tentam me violar
lanço fagulhas,

agulhas e espadas
que ferem tão mais 
e tão menos
por dentro eu sou negro 
como por fora
mas há as entrelinhas, e como há
mas elas são cheias de rabiscos coloridos e sem cores
e há os que não podem ler 
os que podem mas não
e fico aguardando o alguém que vá me decifrar
por que eu sou feito de camadas, amadas e sofridas
polidas de espera
saturadas de pretensões





Queimados, janeiro de 2012

sábado, 21 de janeiro de 2012

TEU CORPO TUA ALMA

a um amigo querido

não te esqueças

ama teu corpo
que o tens pela vida

guarda tua alma
que te sobreviverá

lembra da estrada
caminho seguro
que pensei te ensinar




Rio, janeiro de 2012.





AS COISAS LINDAS AS COISAS FINDAS

para minha mulher


sonho em pleno dia com o que temos
com os elos que nos ligam
sonho no sono calmo
depois de uma vida
antes da partida


por todos os lados ouço
sinais inaudíveis
invisíveis
mas presentes
como sonata límpida e serena 
em quatro movimentos


escuto essa música no ocaso da alma
feliz porque a compusemos


nada perdemos 
ganhamos
só o tempo passou


assim
sem solução


mas quanta beleza trouxemos 
desde que nos demos as mãos


enfim há diferenças entre ontem e amanhã
o que foi é lindo
como as coisas findas de Drummond
mas muito mais que lindas
são como flores em botão


Aninha Alice
Pedro e logo Lucas
pelo tempo que nos resta
encantarão


a vida já vivida muito mais que sonho
é conquista
que a memória torna lembrança
tão linda


as coisas findas são a música
a propor que o amor existe
porque assim tocada 
resgata a verdadeira canção  


Rio, janeiro de 2012.






sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

VIDA PENSADA VIDA VIVIDA





resposta a Maria Luiza:
mas a vida, minha querida,
nada pode nos dar
exceto o que podemos conquistar.
   




nem pensada nem vivida
a vida é o que temos
sem escolha


será a vida sofrida
ou para sempre gozada?


não será a vida apenas o que nos tornamos
quando já nada podemos 
e as energias perdidas?


o que sei é que ainda desejo viver
de resto
nem Pessoa pode dizer...


Rio, janeiro de 2012





sábado, 14 de janeiro de 2012

UMA DECLARAÇÃO DE AMOR AO RIO



encontrei um carioca na praia
finalmente
entre brancos paulistas
e louros catarinenses
era sábado à tarde do mês de janeiro
e lá estava ele inteiro
mulato maneiro
branco inzoneiro
negro para mostrar o negro
da musculatura malhada
todas as peles molhadas
espelhos de sal ao sol


como pupila de criança
descobri o carioca
neste verão do Rio
de janeiro a janeiro


sem desprezar os turistas
olhei só o encanto
de gente tão dengue
cheia de eternidade
em suas formas douradas
nesta cidade
resumo da beleza do mundo
bem amada
razão e fundo da delicia de viver


ah cariocas súmula de todo o país
criastes em Ipanema [Flamengo Irajá ou Leblon] 
essa gente
diligente esperta inteligente
a conjugar o seu mar
do presente
nos tempos do verbo amar


Rio, janeiro de 2012.





ESSE MAR ESSE RIO



esse mar que se derrama lindo
brilhante sob o sol
macio sobre a areia branca
encanta-nos sem querer


é ficção eu diria
tal beleza não existe
é só a alma que insiste
em viver no paraíso


belisco-me para saber se vivo
sinto o beliscão
e a alegria que de beleza é feita
enche-me o coração


esse é o Rio de meu bem querer
visto de Ipanema
em meio a tantas garotas
e inevitáveis "lekões"


tá-me faltando o Tom
para entoar
e o Vinicius de Moraes
[ah é demais!]
para cantar


Rio, janeiro de 2012.




A DELÍCIA DE AMAR



não há culpa em amar
ama-se porque se ama
outra razão não há


que seria de nós se o amor pesasse
que miséria seria não o ter


falam do coração
mas não vejo o coração envolvido
percebo o inconsciente dominante
inteiramente


quanto a mim


o que sou hoje me pertence
o coração bate normalmente
após as pontes que o ligam à vida 
intensamente


hemácias transportam oxigênio
um tanto de gás carbônico
sem efeitos sobre o aquecimento global
mas suficientes 
para as necessidades vitais


sinto-me dono de mim mesmo
na indulgência consciente
que vem do inconsciente
para me doar o fim de vida


procurar razões quem há de?
não há razões
mas deliciosas sensações 
nessa história mal contada
de amar   


Rio, janeiro de 2012.




quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

E LA NAVE VÁ



se não te conheces a todos ignoras
porque o que vivestes há de integrar-se no todo
como parte do conjunto
que não se separa

não tenho memória do mal
mas sei
o preço alto que paguei

os ponteiros do tempo fazem passar as horas
não suprimem as razões que doem
mas quem me deu consciência deu também coragem
de decifrar a pedra e removê-la
para construir-me gente

cada minuto compõe-se dos mesmos segundos
que somam as horas e definem os dias
nada se dispersa
tudo se conjuga

extirpa-se o mal por conhece-lo
decifra-te


Rio, janeiro de 2012.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

SER e NÃO SER



nem sou nem fui nem serei
o que mesmo
nem sei


se sou engano-me
se fui esqueci
o que serei se tempo não tenho


só me resta lembrar
hoje sei é sonhar
para logo tudo esquecer



Rio, janeiro de 2012.






domingo, 8 de janeiro de 2012

SAUDADE [um improviso]




saudade entra na gente e fica
mesmo depois de sair
saudade é ter presente o ausente
e não cansar de sentir


Rio, janeiro de 2012.




FORMA





procuro a forma que não encontro
abro janelas
fecho portas
passam sombras
imateriais como o sonho
cheias de medo
a recolher-se no claro
por sob seres e coisas inteiros
que vejo normais


ouço a música do vento
soprando por sobre a relva 
ouço-a sem nem mesmo pensar
na consciência do olhar
que derruba mitos
e sobrevive ao ruído
redondo
no ritual de rodar


um ralo sentido começa a esculpir
fendas de puro ouro 
como castiçais
queimando jogos de azar
e da janela assomo 
para de novo a fechar
há um sono sem sonhos no imenso pesar
assim como choro
por nada encontrar


sussurram-me verbos
palavras perdidas
entre a terra e o céu
no temporal que é outro
e foi este amanhã
no sol que anuncia nuvens pesadas
e a ressaca no mar


vejo casas ruas e praias
gente entre mim e o sonho
fantasia sob a chuva que cai
vejo e não ouço
esse gosto se disser mei amargo
de tentar encontrar


talvez n'outro mundo
de fé
ainda veja o que suponho existir
pois nele toco um murmúrio
que ainda no transe
me remete ao passado
e me faz escutar
o que as coisas e seres visíveis e claras
nunca deixam sua sombra criar


Rio, janeiro de 2012.




VIVER É BOM



entre rasgos de paixão
faço minha costura à mão
acaricio belisco dou pitacos
pra despertar o coração


acorda coração
a vida é curta
não vale perdê-la não
acorda que o galo canta
já é hora de viver


entre o sono e o sonho
desperto toda manhã
o sonho fica o sono vai
coisas vivas objetos tudo que passa
flores sombras perfumes
nunca volta
enquanto o dia se esvai


ao chegar o por do sol
tomo o coração pela mão
levo as lembranças e a saudade
de quem sou 
levo todos a quem amo
levo o amor de carona
vou levando e vou deixando 
o sono-sonho voltar


e todos os sonhos transformam-se
numa noite de luar
e todas as vidas retomam
a intensidade de amar


é noite mas há estrelas
que me ponho a navegar
tudo é verdade
não há medo
tudo é amor 
não arremedo
de esperar amanhã o novo sol
e tudo será igual
no que é bom 
diferente no que não é


ouço o galo
já é hora de acordar
acorda
que viver é muito bom


Rio, manhã de 8 de janeiro de 2012. Faz sol.







ARREBATAMENTO








o apito que soa distante é saudade
saudade que tenho do trem
da fumaça que se perdia
do amor que não se perdeu


sopra o vento leva a fumaça
a fumaça se desfaz
mas o vento não arrebata
o amor que tenho por ti


Rio, janeiro de 2012.












INDAGAÇÃO




o que acontece quando a Lua desaparece?

o amor parte atrás do luar
que brilha em outro lugar


Rio, janeiro de 2012.





sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

A LIBERDADE DE SONHAR





é quase um sonho o saber abstrato
do querer 
é sonho também escolher  


o mistério é ser 
sem nada querer

quando o desejo nos guia
a vida é só a estrada
do sonho que longe se vê


nada portanto sei
do vento que arrebata realidade que não criei


***



um sono lento deita comigo
o sonho ocupa o lugar
em quem o faça viver

há em ti o bem 
recente e presente
se se sustenta não sei


lá fora nem tudo se pode
por dentro o que se quer é poder


teu sonho não o obrigo
só o abrigo desque nasceu
tempo já faz
num mundo alheio 
no descaminho que conheceu


na encruzilhada o destino é teu
ter razão ou não a ter
é juízo que não farei
     
a liberdade é bem 
a ser vivido por cada um
de minha parte sempre fui livre
na liberdade morrerei


se vale o conselho
não te obrigues
deixa viver o que é teu


se me podes entender
tens liberdade de escolher
o destino é teu




Rio, janeiro de 2012.  







OUTRO MUNDO





num outro mundo o mistério era lembrar a necessidade de viver
era profundo o desejo de não ser




Rio, janeiro de 2012

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

AMANTES







no dia claro
o mar é diamante
na noite escura
amar é de amantes


Rio, janeiro de 2012.





NAUFRÁGIO




um poeta sem poemas
é um ser desconhecido
abandonado por seus versos


o poema tem identidade percebida
navegando vagas idéias conhecidas


a sobrevida do poeta
compõe-se de palavras indistintas
que flutuam sem nem mesmo navegar




Rio, janeiro de 2012

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

O OUTRO





um outro ser é outro mundo outra dimensão
não o deciframos nem o entendemos
ainda que o amemos
resta a indagação


como será saber o que pensa
o que sente o que diz o que o expressa?
como será viver-lhe o pensamento vivo
a densidade do afeto
seus valores éticos
e o entendimento do mundo?


como serão seus sonhos
será verde o verde ou mesclará semitons de amarelo
e o afeto o amor e o sofrimento?


incluirá o amor alguma forma de dação?


tudo é indagação
os segredos da alma
estrelas e planetas em outra dimensão...


Rio de Janeiro, 2 de janeiro de 2012.















domingo, 1 de janeiro de 2012

2012 SIMPLES ASSIM

[de uma frase feliz de um amigo querido]


saudade do ano que passou
alegria do ano que começa
tudo foi bom então
tudo pode ser melhor


basta ter objetivos
basta sonhar novos
ter metas esse é o único segredo
da realização delas


mas olha-te por dentro
instala um dispositivo de paz
medita sobre teu passado
constrói os alicerces do futuro


erros enganos todos cometemos
mas saibamos graduá-los
para jamais repetir os graves
e evitar os evitáveis


mas olha para fora
contempla o universo
o caos e sua ordem aparente
fala alto domina tua mente


cada estrela em seu lugar
o sol para acalentar
a Lua para amar
e a certeza de que podes acertar


2012 é apenas um novo número
a dar lugar a cada dia
há-que continuar a sonhar
há-que saber realizar


não há mistério
2012 simples assim



Rio de Janeiro, 1 de janeiro de 2012.