quinta-feira, 25 de novembro de 2010






Bards of Passion and of Myrth
Ye have left your souls on earth!
Have ye souls in heavens too,
Double-lived in regions new?
[John Keats]


ali onde a vida se demora
o poeta ensaia o canto chão
diz homem grita gente
e se pergunta
onde a beleza o fim ao menos
à sombra escura do sagrado sono?

protegido e vencido
busca num imaginário paraíso
o amigo quiçá definitivamente perdido

o deserto à frente reflete a luz
ofuscante luz que o sol nos manda
sobre as dunas onde nada existe
e o vazio será síntese
da desesperança

dupla vida que é e deixará de ser
a um só tempo nesse transe sem sentido
da verdade desde sempre
do poeta que busca a eternidade
entre a terra e o paraíso
homem e homem
a viver intimamente suas paixões

é muito pouco o que desejo
e a angústia de partir
mata-me a vida
ainda tão plena de paixão

corro em busca do outro que me encanta
e canto quase sem razão

Rio, novembro de 2010





CANSAÇO






pode ser que amanhã seja outro dia
cansado de repetir-se
depois de tanto tentar ser diferente

esse tédio é peso pedra submersa
não é pássaro

que farei desses dias que me sobram?
iludir-me apenas com os que faltam?
fingir que sei o que não quero?
ou sem mais
sem nome
rente ao chão
deixar-me ir inutilmente?

tudo passou
pouco restou
sob o sol a sombra
que à noite se dissolve

digo homem
falo gente
nesse imenso sono que me abate
e me pergunto
que fui eu?

Rio, novembro de 2010





terça-feira, 23 de novembro de 2010

SE EU ABRIR OS OLHOS






se eu abrir os olhos escutarei o ruído das ruas
voltarei a mim se eu abrir os olhos
perderei o sonho mas não serei o mesmo
porque sonhei
para não esquecer o que sempre quis

sonhos são como ave
leve livre solta pelos caminhos do ar

se eu abrir os olhos
coisa que não farei
tresloucado frágil o pássaro serei
a procurar abrigo
em tua mão

porque lembro que te falei
tudo o que sonhei
para não esquecer o que me fez feliz


Rio, novembro de 2010





segunda-feira, 15 de novembro de 2010

AMOR À VIDA





não quero a noite ainda nem o silêncio dela
quero o dia claro e o calor do sol
o ruído das ruas
o alarido das gentes
o vento fresco e a sonoridade da vida

só comigo ainda estou completo pela memória
que aflora das profundezas de mim
esperto
para acender o coração
no tempo que me resta
pouco ou muito pouco importa

nenhum gesto é vão

Rio, novembro de 2010