não canto o ano porque vivo o dia
sucessão de outros dias
antes vivê-los assim
instantes
sem perder a esperança
o ano que entra não sucede o que sai
um fenômeno sideral
como ondas que rolam sobre areia
somos sempre nós mesmos
diferentes na intensidade
diante de mim tenho o horizonte
e cá bem perto minha janela
daqui vejo a realidade
já por lá toda magia
do inconsciente que sonha
o ano passa qual nuvem ligeira
por um momento atormenta minha alma
mas nem o vejo ao romper o novo dia
o sol no alto me ilumina
glória em vida
o que durmo sou quem passa
mas vivo cada dia a alegria
ontem não existe
finjo o que hoje sou
só no futuro há fantasia
e assim penso e assim vivo
o que me é dado é meu fado
o que não é meu não será
reservo-me para a viagem final
"...tutto il passato in un punto
[...] non turberà suono alcuno..." *
"atrás não torno [...] só há lugar no futuro..."**
* variante de Eugenio Montale (Quasi una fantasia)
** variante minha, inspirada em Ricardo Reis (Fernando Pessoa)