cresce a maré
lenta move a linha do horizonte
escura sob a Lua
o ar distila gotas microscópicas
à vista d'olhos
o volume se agiganta
e o silêncio surdo
desaba sobre a areia branca
então nada mais é movimento
exceto o silêncio renovado
de nova onda
sobre a areia derrotada
Rio, setembro de 2013.
um poema habita o toque de meus dedos
fiel a mim mesmo
súdito de tais toques
tudo é possível
nada é falso
(temo por isso o que digite)
pedra sólida
em que me refugio
como fonte e torrente
em busca da palavra cujo único som
toante ao nascer do sol soa solene
o poema
Rio, setembro de 2013.
nítido azul claro dia
fora de mim ganha-me assim
como a brisa que arrefecida sopra
fresca e dolente e se conserva clara
na fina estria da areia branca
derramam-se verdes ondas
então grisalhas
dissimulando frias arrepiados corpos
apolíneos bronzes
em pranchas breves sobrenadam agudas
enroladas vagas
tingindo em cores o mar diamante
é fim de inverno
Rio, setembro de 2013.
Voyager entre estrelas
deixa Terra abandona o Sol
e toma o caminho do nada
que é tudo como a sorte
do que o acolherá
se jamais
Rio, setembro de 2013.
não o som mas a música
que a sentir me lembra
quanto ao redor é mudo
quanto seu canto é tudo
Rio, setembro de 2013.
prata o mar à distância
na contemplação fria
água aquecida sal
qual metal estendido
rítmo e ondulação
pesadelo do barco só
singrando a lonjura do nada
dura distante [há] vida
feita areia branco e pó
sob o sol
sensual
Rio setembro de 2013.
seria inverso viver como um deus
com o poder da criação
para mudar a premissa do não
à vista o destino sentido
reconhecido no horizonte e à mão
um projeto antecipado à luz da razão
e se os olhos bem olharem
se os ouvidos ouvirem
ver-se-ia clara a força da invenção
perenes sentidos sentiriam o tempo
o mesmo tempo da vida
e viveriam de planejar antes de criar
o que pode ser tem o poder de ser
focado na idéia clara
do que virá a ser
precisa razão tranquilo coração
não se perderiam no prolixo da especulação
no limite preciso do fim
Rio, setembro de 20013.
não quero o futuro desconhecido
mas o horizonte de-fi-ni-do
a que me destine com precisão
é difícil sobreviver com o não
da perspectiva invertida
que impeça a construção
são tranquilas as horas sensíveis
da visão do previsto em sua forma ideal
em que posso errar sem hesitar
são a pintura visível da construção
que incita a criação
e dá ao traço a leveza da intenção
quiçá porque imitamos deuses
em cores definidas reta
curva da imaginação
não não quero o desconhecido
(se é que posso querer)
diante do desafio temo não saber viver
Rio, setembro de 2013.
fiel não sou exceto a mim e ao que sou
tenho mantas de mim auras
colorindo a alma
fiel porque muitos
entre auras e almas
que não me disputam
que não desafiam
neste frágil e incerto mundo que habito
no fim nada serei
no deserto de um futuro não sabido
nem infiel diante de todos
nem fiel
só o abismo
Rio, setembro de 2013.