domingo, 30 de março de 2014

HESITAÇÃO



derrama-se o mar de madrugada 

águas vêm e voltam
sobre a plácida praia
imaculada
movimento da hesitação 
que é vida

Rio, março de 2014.



domingo, 23 de março de 2014

UM HOMEM



insubmisso
o homem não se curva ao vento
o homem não se curva à chuva
não se curva ao gelo do inverno
nem ao calor asfixiante do verão 
sobrevive à própria consciência 
que o perturba
que o absolve ou condena

sozinho
esse homem trás em si a força de ser 
inquebrantável força 
supera o que o ataca 
ultrapassa os limites dos anos
nunca se abate
e avança para  mudar seu destino
para não se arrepender depois
do que poderia ter sido e não foi

apaixonado recomeça com novas ideias
nunca estrangeiro a si mesmo
abre as janelas da vida
para apurar o conhecimento do mundo
e recusar o medo
que as coisas humanas trazem para assustar-nos
e descansa por haver escolhido o caminho
o único caminho atento
para tudo entender e nada esquecer

esse é um forte.

Rio, março de 2014.

sexta-feira, 14 de março de 2014

DE MINHA JANELA

da janela vejo o mar aberto
e um ângulo de praia
ilhas ao largo 
amarras
que dão vida à eternidade

faz sol (quase o tempo todo)
e tempestades no verão

sopra a brisa sudoeste
úmida a areia nova
penso em ti tal como Caieiro

tu me trouxeste a natureza
e a beleza

dias e noites costuram-me à vida
alegrias e tristezas
só minhas por amor talvez platônico

e tu oh sol
aquece a dor e o prazer
para alongar sob o céu azul
padrões de minha solidão

não troco minha Ipanema por nada
traz-me paz e garante o desejado fazer nada
desfila ali a meninada
sarada

que mais desejar na vida longa
o "brouhahá" alegre da praia
a noite calma
e o silêncio do ir e vir suave 
do mar a derramar-se 

Rio, março de 2014.

VELEIRO


quero um veleiro para navegar o vento

e velas brancas para alçar meu vôo

levo a memória comigo do azul em branco

nuvens  flutuantes sobre gaivotas

nada terei em mãos

exceto a prece de alguém sonhando
com mar e céu descrevendo a vida

Rio 14 de março de 2014.


quinta-feira, 13 de março de 2014

GAIVOTAS ILHAS



é sonho ainda quando o amanhecer dourado
destaca o verde recobrindo a pedra
diante de meus olhos
ilhas

o mar azul as cerca de grisalhas cristas 
à distância sonolento desperto
com a visão de velas brancas
gaivotas 

em Ipanema é dia 

Rio, março de 2014.


   

PEDRAS



meus olhos estão cegos de tanto ver
o deserto de pedras

onde está a cerca a definir limites

sinto a suavidade de teu olhar
que pode ver o infinito  
e revelar que sonhas

só há mistério onde não há sentido

a distância que nos separa no tempo é o limite
o sensível tornado insensível
em tuas pupilas fotográficas

quanto te olho e não posso sentir teus sonhos

só o deserto de pedras reflete o que vejo
e sobrevém o suspiro
lacrimosamente

Rio, março de 2014.


quarta-feira, 12 de março de 2014

CICLO


passo a porta do tempo
esqueço meus sonhos
encerro a memória dos fatos
e não me conduzo
deixo-me ir

penso nisso e em suas circunstâncias
não sei se compreendo
é só um mundo novo
valerá a pena vivê-lo
e trabalhá-lo como um jardineiro com as plantas
semear fazê-las vingar

se esqueço meus sonhos
crio novos

e a lua brilhará 
refletindo a luz do sol
depois de deixar sua órbita e voltar 

tudo novo 
tudo por explorar
na permanente reconstrução 
em seu ciclo universal

Rio, março de 2014.






sexta-feira, 7 de março de 2014

A PEDRA E O TEMPO



o que sente a pedra sobre o tempo
presente passado futuro
perplexa  
enquanto nosso tempo passa
e neuroticamente o medimos
segundos minutos horas
numa só e inútil ilusão

assim admirando a pedra
fico
o meu tempo é um compacto pétreo de tempo
desestimula como sonho o futuro
funde fatos do passado
e se esse é o nome do jogo 
é presente

São Paulo março de 2014.

quinta-feira, 6 de março de 2014

VIDA



amo a janela que se abriu há setenta e tres anos
loucamente sorvi o sabor e o perfume do que vi
sei que é longo e que o tempo corre
mas ainda vivo a alegria de existir

São Paulo, março de 2014


sábado, 1 de março de 2014

POEMA INÚTIL



um dia qualquer numa manhã qualquer
um longo rio há de chegar a sua foz
terá sido a realização do mistério da vida
um segredo da natureza
tais que a árvore o monte a planície de que fala Pessoa [Caieiro]

"let's go home" dirá quem me virá buscar
porque escrevo na inútil tentativa de ultrapassar esse momento
e deixar algumas palavras por vezes preenchendo idéias
para uma posteridade ambiciosa mas perplexa
porque não poderá ser verificada

a casa que me está reservada terá um só cubículo
dificilmente habitável
mas destinado a quem viveu ilusões
e doravante não poderá ultrapassar
as quatro paredes sem janelas
de onde não verá o dia nem a noite
só o tempo
que não se medirá

hoje falo comigo também
na penúltima esperança de ver o outro lado
a margem esquerda
mas ninguém se importa com o desaparecimento 
da minha frágil e tentativa ponte
entre duas margens das quais uma só conheço
desse rio que seguirá seu caminho

tarde atribuí-me essa tarefa
como quem constrói essa ponte
entre hoje e amanhã
mas não haverá amanhã exceto para muitos
que não se interessarão pelo que escrevi
a ponte incompleta cairá em ruínas
o rio chegará à foz envolvido pelas águas de outros rios
desconhecidos rios frígidas águas
claras ou poluídas
e o caudaloso rio de outras vidas
ocupará o vazio

Rio, fevereiro de 2014.