"Porém, pera cantar de vosso gesto a composição alta e milagrosa, aqui falta saber, engenho e arte." Luís de Camões ... assim encontrareis aqui palavras magoadas a tornar o fogo frio e dar descanso a minha alma condenada ...
sexta-feira, 2 de dezembro de 2011
ASAS
antes que o tempo passasse
encontrei o mundo
e não havia sombras
diverso na tentação
eu estava livre
da minha vida antiga
estranha percepção
de navegar distante
na direção de tudo
sem perder nada
sem esquecer a vida que em mim viveu
secretamente deixei-a
para ter asas
neste poema
Rio, dezembro de 2011.
UM GRITO
...acordo
toco-me incrédulo
estou vivo!
olho em torno e vejo a luz que penetra sutilmente pela veneziana
respiro o ar fresco
e o mistério instala-se
para deixar-me encantado
com a sensação de outro dia
estou vivo e capaz de lembrar-me de operações banais
o sol tímido desponta entre o cinza pesado de nuvens
que teimam em não partir
vejo o mar
derramando-se
tão próximo de mim
sonho a vida e nada me dói
estou vivo para mais velho um dia
debruçar-me à janela
e livre do mistério da noite
despertar dos sonhos
uns bons outros estranhos
formas de pensar
em quem amo quando feliz
no que odeio
em fantasmas que me assombram
na rua o barulho
enche-me de horror
horror indefinido
que me tira de dentro de mim
percebo partes do engano
que inventamos
para burlar desígnios divinos
não culpo ninguém por isso
tenho de quem me ocupar
convenço-me do potencial
de meu amor não só à vida
mas a pessoas que a vida trouxe
para encantar-me
não estou isento de ódios
é humano odiar
os que trazem mal em suas ações
que o induzem a erro
e desviam outros dos caminhos retos da vida
odeio a mentira e a deslealdade
a nortear comportamentos distorcidos
sob falsas razões
da face negra da alma que desestimula a vontade
e protege a lascívia dos desejos
de nenhuma auto-estima
no abismo da pobreza nada floresce
exceto a ignorância do abandono
a carência do amor
nos vícios das ruas
distorções que se tornam regras
no conflito entre não ser e parecer ser
quanto mais compreendo isso
mais entendo as razões dos comportamentos
dos mal-feitos das distorções morais
a fazer brotar na alma envilecida
desejos inconfessos parecidos naturais
o sono e o sonho mantém-me vivo para outro dia
para o estranho juízo de tudo
são vielas do descaminho
não serei o cronômetro do tempo
a desligar sem deixar traço
não
não me autorizo a ser um saco de colher vento
para acabar como a pedra
atirada no abismo sem fundo do desaparecimento
há-que arrancar máscaras
há que lutar contra a escura escuridão
da desgraça e da ingratidão
de negar a humana condição
Rio, dezembro de 2011.
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