terça-feira, 25 de novembro de 2008

SELVA





nem antes nem depois
tudo aconteceu
e nada mudou

exceto tudo
em crise de sobrevivência

o repentino encanto do real
no sonho de reviver
a alucinante selva escura

Miami, novembro de 2008.

domingo, 26 de outubro de 2008

ADEUS LONDRES






o inverno ronda Londres
vem do mar molha a terra
com a umidade cega
que se desfaz
nas ruas de noites silenciosas
dessa gente retraída
em palavras sem palavras
debaixo de janelas fechadas
à sombra de lâmpadas amarelas
sem um grito
sufocados

nenhum gesto
luz opaca
claridade repentina
de um farol indistinto

no escuro florescem
sem vida as manhãs
não demoram
duram horas

vem o cinza em pranto
só para que passe
um outro dia
que se cala


Londres adeus! outubro de 2008.


sábado, 25 de outubro de 2008

VÉSPERA








melancólica véspera do nada
bem guardada na ante-véspera da solidão


Londres, outubro de 2008

VERDADE



ergui minha casa sobre o sonho
e protegi-me de sol e chuva
sob a emoção
na fonte
por onde sibila o vento
e sopra o que lhe convém

sonhei que navegava
ondas de percepção
de onde estive pressentia
o apelo da manhã
sob tênue sol
que me aquecia

se eu soubesse então a reverência
do sonho submerso no real
não viveria
nem sobreviver conseguiria
frágil que fosse
à verdade que me consome

Londres, outubro de 2008.

SENSAÇÕES TARDIAS






lábios trêmulos
ausências mansas
muita gente sombra

o silêncio emocional
esconde a alegria
que partiu

neste intervalo
tudo pouco importa
nem desamor

a véspera de não ser
é frágil
é lembrança e é passado

tudo pára
quem importa já não vê
o visível sentido do que tudo se tornou

resta pouco
corro atrás do vento

Londres, outubro de 2008

sábado, 18 de outubro de 2008

AMAR O AMOR




amei a vida nos lugares
por onde passei
sempre com pressa
nunca devagar
amei os lugares
onde passaram lábios
e se deixaram acariciar
amei quem não me amou
quem me acariciou
quem me pretendeu dominar
amei a vida em todos
que de mim tiveram um pouco
amei como muito poucos
o amor que tateei
e sem querer negligenciei.

Londres, outubro de 2008.

TRAVESSIA



atravessei o mundo sem prestar atenção
tudo parecia claro
uma narrativa da natureza para o coração
o movimento oscilante
o murmúrio de homens aparentemente despertos
o mar horizonte distante
tão simples...

ah o clamor da vida perdia exclamação
diante do abismo da arrebentação
por onde passaram dourados
corpos ao sol construindo seu mundo
no equilíbrio instável desse ir e vir
tão simples...

o inglório presente leva-me longe
para esse futuro do qual me abeiro
entre os vagares da saudade
e as indagações compulsivas
do que sabemos nós
do que não sei
tão simples...

como se não houvera a selva escura
será bom deixar espaço
para um pouco de ternura
como se as nascentes tornassem a fluir
tão claras
já que chorar é sempre mais fácil
simples assim...

Londres, outubro de 2008.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

PASSAGEIRO


PASSAGEIRO


Não sou eterno
o que há é o mundo
de que sou passageiro
nem a verdade me toca
nem a mentira me esgota
naquela disponho
nesta suponho
e estou só com meu corpo
como um poema
condenado ao passado.

Quem me condena?
Os inteligentes ou os bem lidos?
Sou o que sou e não passo
de passageiro no mundo.

Londres, outubro de 2008.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

E-MAIL



para Octávio


Provavelmente terás mudado para trás no tempo
inútil igualmente igual
na rua de antes a mulher de sempre os filhos crescidos
e a evidênca do sol que desce no poente
e resume o ciclo
desta realidade que é a única verdade do que não concluímos nunca.
O Cônsul não é notícia é decadência
nem mais nem menos evidência
do mesmo ciclo
curvado sobre a juventude em busca da história
de u'a mesma humanidade
jornaleira.

Abraço de improviso


Londres, 30 de setembro de 2008.

domingo, 21 de setembro de 2008

NASCER DE NOVO





Se eu nascesse hoje
tudo quanto fui
teria o adeus sem pranto
do sonho que a penumbra de um útero
deixou p'ra traz...
Serei eu de novo mas comigo
seguro de meu tempo
e dono do que quis
no tempo inconsequente
sem história.
Há saudade difusa nisso
talvez do que amei
com certeza do que deixei de amar
em terra estranha
onde vivi cativo
sem o encanto do meu mar.
Se eu nascesse hoje
tudo que sou
não seria mais.

Cambridge, 20 de setembro de 2008.

CELEBRAÇÃO





Celebro um tempo em que o mundo era suave
meu pai meus irmãos e o piano
de sua doçura e toque apaixonado
e eu era lúcido...
É doce deixar-me embalar pela memória
em minha história sempre italiana
dos deuses e heróis
onde meu mundo principia.
Madrugadas alvas sobre o terreiro
do café requeimado pelo sol
o velho capataz as vacas de leite
que ainda procuravam a trilha sobre o rio.
E em cada horizonte a luz
muda a cor do céu
o silêncio que inicia o dia
na descoberta da alegria
de minha gente abstrata e antiga.
Nem um retrato que me dôa
tudo que o tempo longinquo não perdôa
na lembrança da alma ainda inquieta
com o movimento de encontrar o tempo.



Londres, 19 de setembro de 2008.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

ESPERA






espero
o dia que não virá

a noite que tudo cessará

longa espera na desesperança
de meus dias
tão carentes do sol

sereno nada quero
exceto o horizonte do mar

Rio, janeiro de 2009

quarta-feira, 18 de junho de 2008

ESCREVER VERSOS



ninguém lê meus versos
mas insisto quando sinto
in-tui-ti-va-men-te
o desejo de escrevê-los

talvez nada digam
talvez digam tudo
talvez maus sejam bons
ou vice-versa
mas pereçam bem sem nenhum mal

cada um tem sua razão
e talvez sua beleza
mas não me escondem
nem me revelam

escrevo-os como espelhos da memória
às vezes da lembrança
como um rito

agrada-me a idéia de que passem
na ironia de escrever
e deixar soprar o vento


Londres, junho de 2008.

terça-feira, 17 de junho de 2008

MISTÉRIO




deixei perderem-se momentos
segundos e minutos
tantos

areia que se esvai
clepsidra que me domina inteiro
como hidra

e tudo o tempo perde
o que ficou
o que sobrou

mistério perecível
como o vento

Londres, junho de 2008.

SUTIL




nunca terei certeza de haver vivido



Londres, junho de 2008.

VERSOS?




perco-me no mistério dos versos
escrevo sem os ter na lembrança
doces melancólicos duros pessimistas
existem

deuses não há que os inspirem
nem o passado nem o destino ou o fado
nem sou eu que os pense
o que são os versos?


Londres, junho de 2008.

TERNURA




os instrumentos são meus
mas o piano
só tuas mãos de ternura
soam a música que é tua


Londres, junho de 2008.

AVENTURA




eu tramava a aventura
sem saber que
planejada
era impostura

Londres, junho de 2008.
dizem que nunca entendi o mundo
e que vivi a mitologia do sonho
talvez


Londres, junho de 2008.

NEVE




a neve não é fria
mas o que gela
é a vida

se é neve é branca
branca como um somatório de cores


Londres, maio de 2008.

PAREDES




há paredes que não dividem
porque não fecham de ambos os lados
mas a porta intimida
os desavisados

Londres, junho de 2008.

SORRISO




talvez tenha sido assim que sorri
só foi o tempo de descobrir
que lá fora [ou aqui dentro]
havia gente


Londres, junho de 2008.

A CHAVE



fiz uma chave da porta
mas não a abri
estava escancarada

julguei que me enganara
nunca conseguira entrar
e tampouco sonhei
que fora Kafka

como sobra de sonhos
tudo depende da prova
e do desenho da vida
de alguém que namorou o vento

vi imagens claras
de muita gente feliz
fui capaz de entender
porque não entrara

aquém da porta
não havia ninguém
exceto eu e a chave

Londres, junho de 2008.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

NET


Os trechos de conversas extraídas da NET são testemunhos da solidão. Poucas vezes uma descoberta, mas apenas a busca de alguém para dialogar. A conversa em salas de “chat” revela o jovem atual dialogando com o vazio, sem respostas.


Londres, janeiro de 2008

Momentos ilhéus




Saudade [1]

ando cansado cara
tô com saudade de casa
e porque não volta?
nem pensar
lá tenho minha mulher

Saudade [2]

tenho saudade da Francisca
daquela trubufú?
é
não sei como
feia com a necessidade
é
fica até mal pra você
é
mas você já dormiu com ela?

Bigode

outro dia encontrei a Eralda
e daí como ela tava?
de verde
não foi isso que perguntei
que foi então?
ela tinha raspado o bigode?

Londres, janeiro de 2008.

Conversa de pub




Mulher [1]

que sacanagem cara
voce bate em mulher?
bato
e a sua não reclama?
ela gosta

Mulher [2]

ih rapaz minha mulher diz que vem de Minas
que bom pra você
bom nada
vou ter de mudar de casa
por que?
tô comendo a vizinha de quarto

Mulher [3]

ela não é casada?
é e daí?
eu também sou

Mulher [4]

sabe aquela goianinha?
qual?
aquela cleaner
sim a do escritório
ela mesma
pois é

tá dando pro inglês
como soube?
ela me contou
então é falso
mulher não conta isso assim fácil
é
mas não foi facinho não
tive de comer ela três vezes
mentira sua
por que mentira?
ela me disse que você morre na primeira


Londres, janeiro de 2008.

Cenas londrinas


Profissão

Deus é bom
nunca me deixou com fome
não
não me deu filhos
aliás
deu dois
mas ficaram com mamãe
senão como vou ganhar a vida?
mas o que faz?
sou acompanhante
e acompanha quem?
quem precisa
pessoas doentes?
nem sempre
velhos crianças?
crianças nunca
homens e mulheres?
só homens
por que essa discriminação
ora
você parece ingênuo
por que?
porque não compreende
o que?
cara
sou puta

Matemática

você estudou?
sim
que curso fez?
matemática
ops
inteligente
e trabalhou nisso?
nunca
por que?
porque não dava conta

Homem

e ele é bom pra você?
muito
e do que se queixa?
falta de sexo
e porque falta?
ele gosta de homem

Desistência

sabe eu desisti
mas você é jovem ainda
sou mas não sou bobo de insistir
no que?
em continuar nesta vida
mas você pareceu sempre feliz
e sua família que acha?
minha família não sabe de nada
mas afinal
você não me disse
o que faz na vida?
sou escorte

Londres, janeiro de 2008.

domingo, 15 de junho de 2008

Londrinas



Desespero

socorro!
vem alguém aqui por favor
onde?
no meu apartamento

endereço
Queens Way
socorro!
o que está acontecendo com você homem de Deus?
passei a gilete nos pulsos

sai sangue e dói!
mas vc não queria morrer?
queria mas dói muito


Emprego

me arranja um emprego?
mas você não tem?
tenho

mas a polícia anda dando em cima

Inglesa

sabe arranjei uma inglesa
pô cara legal
e trepa?
não
e então
então levo ela passear no parque
legal cara
depois trago pra casa
e daí?
ela faz um boquete
boquete?
sim
e não trepa?
não
por que?
ela tem 88 anos

Londres, janeiro de 2008.

Namorado [1]

eu sempre quis ter um namorado firme
então
sério
então
carinhoso
então
você é assim?
não

Namorado [2]

lá em Minas eu era noiva
e o deixou?
sim
por que?
porque ele não era homem

Namorado [3]

vem cá
você está bem de vida?
estou
manda dinheiro pra casa?
mando
tá legal?
tenho passaporte português
não é falso?
não é do bom
então
então o que?
estou apaixonada por você

namorado [4]

eu te amo
eu também
não sei não
porque essa desconfiança?
porque não te conheço

namorado [5]

que procura?
eu?

sim
nada
como nada?

explica
sou tímida
deixa de ser boba fala
alguém
pra que?
pra me fazer companhia

namorado [6]

você é maneiro
legal
o que procura?
nada especial
qualquer um?
sim
pra que?
prum chopp
só?
sim
topa fazer um programinha depois?

Londres, janeiro de 2008.

Diálogos londrinos em um ato


Amor [1]

pouco importa querida
a esperança é substantivo abstrato
é
existe porque você tem consciência
você é tão inteligente
estudou muito né?
sou filósofo
caramba
e o que curte?
trepar querida trepar

Amor [2]

por que julgas que amas?
sofro

Amor [3]

sou gatinha
deito enroladinha no seu colinho
quer?
não
quero um cachorrão

Amor [4]

ah agora mais essa cara
não sou consultor sentimental
mas estou super afim de chupar um cacete

Amor [5]

o que você faz aqui?
trabalho e estudo
fazia o mesmo no Brasil?
pior
parabéns que fazia lá?
era michê
e aqui?
sou travesti

Amor [6]

pensas que podes tudo?
bobagem
toma coragem fala
pra que se depois tu me deixa
eu te amo

vou descobrir quem você é
não pode vou desconetar


Olheiro

cara
a parada eh o seguinte
sim
olharaum e gostaraum
e vão contratar você?
estou esperando um empresário inglês

você é artista?
naum jogador de futebol

o velho tá falando com a FIFA
velho?
sim
quem?
um cara que me viu jogar
em que time jogava?
pelada de rua
e ele prometeu alguma coisa?
convidou pra eu vir pra Londres
e o que disse?
que tenho físico atlético

que sou craque pra time europeu
então é um técnico
quem?

quem convidou
naum
ele é olheiro de rua

Londres, janeiro de 2008

sábado, 14 de junho de 2008

Londres [tragédias londrinas]

Emprego
viu
arranjei um emprego
que bom
que vai fazer?
trabalhar
Paixão
tô apaixonado
brasileira?
não
inglês
Sociólogo
eu odeio o mundo
por que?
sou sociólogo
Desenlace
cara tô na pior
a Scotland Yard quer-me prender
qual foi o crime?
estou ilegal
logo agora que encontrei um inglês
velho rico e viado
pra me sustentar
Opção
saí de lá porque não me compreendiam
Uma noite
você sabe
procuro alguém que me faça feliz
nem que seja por uma noite
conta
já teve?
sim
e o que fizeram?
trepamos
Vida ganha
vim para tentar a vida
e como vai indo?
vou tentando
Latrina
e você que faz?
tô lavando latrina pra inglês
Namorado
eu tenho namorado
não importa
podemos nos ver
mas ele é ciumento
brasileiro?
não inglês
como é seu nome?
José Carlos
Metrô
Ah que sonho
aí deve ser ótimo
é
que faz todos os dias?
tomo o metrô
Chat inglês
meu tempo tá acabando
foi bom falar com você
obrigado
eu aprendi muito com sua experiência
advogado bom de papo
que vai fazer agora?
vou lavar copos num bar
Trabalho
que faz?
trabalho
Louca
sabe estou ficando louca
ora você é muito inteligente
deve agir com calma
está só com saudades
não é isso não
estou louca mesmo
Louco
tô doente
o que sente?
porra você não compreende
fale sem excitação
estou louco
Vida nova
vou ouvir você
tá bem você parece um homem legal
tem educação
à noite não durmo
de dia não tomo banho
sinto meu cheiro
não gosto das minhas mãos
sou um lixo
você não quer vir-me buscar?
.
Londres, janeiro de 2008

Cenas rápidas [Londres]

Comunicação

falar inglês é muito chato
só eles entendem

Certinho

aqui é tudo certinho
basta atravessar a rua com cuidado
olhar sempre pro lado errado

Realidade

acho que estou começando a me cansar de Londres
porque?
nada é real
é tudo em libras

Respeito

meu patrão é ótimo
logo que me contratou passou a mão nas minhas pernas
e vc?
eu reclamei
e ele?
Infelizmente nunca mais tentou

Patrões


e você se dá bem com seus patrões
sim
eles conversam com você?
perguntam do Brasil da sua família?
não
mas então de que conversam?
“good morning” quando eu chego
e?
“Goodbye”

Londres, janeiro de 2008.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

TUDO OU NADA?




por que longe
por que perto
por que nunca
por que sempre?

o que sei
do infinito
ou do finito?

é a vida nada
é a vida tudo?

o mistério é tudo

Londres, junho de 2008.

ECO [2]


Escrevo como quem grita
para sentir o silencioso eco
que não vem.

Canto como quem chora
para molhar os olhos secos
que não vêm.

Talvez me falte o tempo
talvez a voz
talvez o olhar
mas cer-ta-men-te a inspiração.

Londres, junho de 2008.

ADOLESCÊNCIA


ouço por vezes um rumor adolescente de saudade
e sinto como se o tempo não ventasse
e o vento incessante cessasse

haja outono haja inverno passe o tempo
mas que à véspera de nascer
o canto possa cantar
o primeiro som o primeiro sol

sinto ainda o menino frágil
a mergulhar na vida
sonhador
nesta saudade que me embala
como a folha outonal que desfolha
dourada e preguiçosa
e pousa ...


Londres, junho de 2008.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

SAUDADE [mote]



[glosas]

"Saudade! és a ressonância
de uma cantiga sentida,
que, embalando a nossa infância,
nos segue por toda a vida" [Da Costa e Silva]

ou [uma idéia antiga]

Saudade presença ausente
na memória do coração
ausência de tua presença
alimentando a paixão [Flávio]

ou [talvez à maneira de Vinicius]

A vida não é mais a mesma
não se pode amar sozinho
tristeza de tua ausência
tudo me falta e o carinho

[Flavio]

ou [de novo, tentativamente, Vinícius]

Amei e não tive medo
do coração não fiz segredo
quis fingir ao ver fugir
quem me quis fazer sentir
choro hoje a ausência
de tua doce presença
do que sinto ao dizer
que logo te quero ver

[Flavio]

ou [eu de novo]

Prisioneiro de teu carinho
és parte de meus segredos
prisão de minhas verdades
ansiedades e medos
só te sinto saudade

[Flavio]

ou [quem sabe, à maneira de Pessoa]

Não te entregues não te dês
a quem nem sentes nem vês
é a liberdade da lembrança
que te trará esperança
que a saudade retem

[Flavio]

Ou [à maneira clássica]

Havia de ser saudade
na vossa condição
aqueles olhos verdes
minha inteira perdição

[Flavio]

Ou [ainda com rubores clássicos]

Tormento e perigos sofri
inclinado ao pensamento
daquilo que não cabe em mi
e que podeis vir buscar
no sentimento do amor
que me domina o peito
à lembrança do amado
amor que não tem jeito
senão na alheia saudade

[Flavio]

ou [poemeto inglês]

I sense in your eyes
what senses feel
as lust raging for eternity

missing your sweet soul
I feel miserable
spy
watching on your presence
searching for reasons

loosing my senses

the god of my senses
the sole lover

infinity
not for reality
[Flavio]

terça-feira, 10 de junho de 2008

MANHÃS






Nas manhãs silenciosas de meu verso

a brisa sopra leve o sonho

e o que ouço é rumor diverso

no tecido que em palavras ponho



breve tempo de procura

longos anos sem sentido

o que faço é mera travessura

entre palavras perdido


Londres, junho de 2008.

MEU MAR





Borges sonhava cores no escuro de seus dias
eu sonho palavras e o desejo de encontrá-las

na algibeira da memória recordo fatos
no rumor do coração minhas paixões
às vezes uma difusa sensação
de que despertarei

já escrevi demais
mas sinto na tarde
o impulso irresistível
de dizê-las

a noite chega rápido o entardecer é curto
temo esquecer o que me pareceu eterno
no tempo terreno que se extingue

sei que partirei mas preciso ficar
para usufruir os dias
que nas praias brancas me encantarão

gozo o prazer do passado na imaginação
tão rápido o futuro
ao som das ondas preguiçosas
que se desenrolam nas curvas de meu mar.

Londres, junho de 2008.

sábado, 7 de junho de 2008

67 anos




aos sessenta e sete anos arrisco a ironia
estar morto e imaginar-me vivo
na indolente faina de escrever
palavras ignorando idéias

o outono é a última estação
antes do inverno que congela
de modo silencioso e persistente
ondas da hesitação ora de dúvida

o homem conhece seu destino
e não se lhe opõe nem o nega
pois o poema nesta tarde é vida
mais além de sua pena


Londres, junho de 2008.

sexta-feira, 6 de junho de 2008

SUDOESTE




julho
o verso não ignora o novo ritmo
e o calor que meu país me incorpora


o imaginado passado reabre-se
para contemplar o futuro
sem as fantasias do sonho


como os astros o futuro flutua
em busca da última estrela
olhos no desígnio dos céus


tudo é secreto

felizmente indecifrável
à beira-mar os ventos do sudoeste
que não me levam ao norte

qualquer verdade será falsa
toda história parte da memória
o desejo mero ensejo
do que certamente não farei
por pura falta de tempo...



Londres, junho de 2008.


SORTE




Tudo milita em favor da vida
menos a morte
que depende da sorte
mas não permite nenhuma sobrevida.

Londres, junho de 2008

quinta-feira, 5 de junho de 2008

AINDA SOBRE SER ALEGRE OU TRISTE



... é na fria noite de Londres que escrevo
madrugadas que me deixam só com as palavras
e o mundo em torno tecendo o que digo
mas não digo tudo

não creio em idéias muito pessoais
mas tenho muitas e as desminto
no mesmo ritmo delas

prossigo a noite inteira sem falar de mim
mas confessional para os que crêem em confissão
passo como quem anda devagar por todas as confissões
como se fossem minhas

imperturbável surge o poema
que não é alegre nem triste mas poema
para quem os leia alheio a mim
onde só palavras estão presentes.

Londres, junho de 2008.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

ALEGRE OU TRISTE

[para Sônia que me questiona]


... não canto porque seja triste mas porque penso
nem alegre serei
porque sinto
minha paixão não envolve coração
mas tempo

sou livre

portuguesamente apegado à linguagem
literariamente limitado a este hiato
que chamarei de vida
por absoluta falta da palavra
nua ou crua
que me diga o que sou
por que sou
nesta eternidade do momento...


Londres, junho de 2008.

domingo, 1 de junho de 2008

FAULHEIT

[indolência]






não me tentam nuvens rápidas
não tentassem quem se deixasse tentar
pela doçura insidiosa dos céus
e acreditasse no tempo
clepsidra que intercepta o que resta

não a deixo medir
não a quero
intercepto o passo
retiro os reflexos
imperturbavelmente
sinto-me eterno.

Londres, maio de 2008.

SORTE




Horas sem fim esperarei o rigor
da dura sorte
torpe e áspero golpe
de quem me suprimirá a vida.

Londres, maio de de 2008.

CONSTATAÇÃO




Às vezes vem-me a nostalgia
de pensar na amargura de quem suprimiu o sonho
para viver da fantasia das notas
que não lerão os dias.

Perversa vida que faz do verso o seu reverso
na eternidade perdida
de quem esquece a purificação do entendimento.

Nada o salvará da implacável lei do universo
já não cria
recolhido a si mesmo encarcerado
agride o momento que lhe foge
monocórdio
apenas sobrevive ao tempo sucessivo
atormentado
dessa terrível armagura...

Londres, maio de 2008

quinta-feira, 29 de maio de 2008

SENSAÇÃO






sufoco!
o ar que me falta impede-me de pensar
na ilusão de tantas sensações

coisas passadas
algumas sigilosas
quantas presenças
deixaram de alimentar meu coração
mas durarão a duração do tempo
como vento
além do esquecimento...


Londres, maio de 2008.



CULTO




Quem sou já não posso medir
mas sou um homem vivido
um rosto
cristal lapidado na experiência
tramado nos sonhos
translúcido sob a baça luz do poente.

Tardio tempo de antecipadas decisões
que jamais tomei
não me permite o que poderia ter sido
no movimento de astros
imprevisivelmente previsíveis.

Contenho-me diante da noite que o crepúsculo prenuncia
a decifrar naipes embaralhados
e meditar sobre a próxima casa
antes de mover pedras no tabuleiro
da dúvida e da quietação.

Estranho o que me é dado
desconheço o que produzi
não ouso supor o que será
apenas
debruço-me sobre o tempo.

Vaidade não há
transpus os umbrais dos sentimentos mortais
e não pretendo o Olimpo
que sou apenas homem a perseguir o inevitável.

Nunca saberei o que se passará
outras formas outro ser outra dimensão
outra face de vida transbordante
sensível mas invisível
como o vento.

Acima da verdade sobrevivo abaixo
a realidade adquirida
na percepção das coisas independentes
dos deuses ou das gentes
no eterno culto da vida.

Londres, maio de 2008.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

ACHADOS E PERDIDOS




Estava eu em meio de achados
impacientes por não serem encontrados
entre perdidos mal-amados
não atinei por acaso procurando-me
a ilusão nem mesmo encontrei
o outro que era eu no achado que perdi.



NYC, junho de 2002

FANTASIA




A fantasia está dentro de nós
não é a alma mas nos dá vida.


Roma, janeiro de 2004.

SONHOS

.

Os sonhos são a realidade querida.

Roma, janeiro de 2004.

VIDA


a vida é o que sou desde que nasci
sei dela porque existe em mim.


Roma, janeiro de 2004.

GOTA



A memória de ilusões evaporadas
é palavra ultrapassada
em seca lágrima.
Au delà des mots
sou a última gota sem pena.



NYC/Roma, julho de 2001/setembro de 2003.

ALMA ERRANTE




Minh’alma errante erradamente erra
em mil espaços e não tem lugar
ilude-se em seus vôos longos
com o simples brilho de onde existe ar.
Sua ida-e-vinda não me faz um outro
sou o mesmo sempre a sonhar
sou aquele que da metafísica
fez romance tolo e desejou amar.
Quem sabe um dia cansada de voar
pouse e descanse sem depender do outro
que não a quis e se perdeu no olhar.


Roma, outubro de 2003.

DESAPRENDENDO



Teimo em ficar
onde não quis estar,
não pude ir.



NYC, maio de 2001.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

PÉRFIDA ALBION



Chove na distante Albion
que me toma os dias sem me ser presente.

Deixo existir o mundo e faço destas mãos cúmplices
do sentimento ausente.

Frio não quero que me conduzam mãos alheias

porque fico
mas com sonhos
num espasmo da esperança de reaver o sol

Cumpro o rito

movimento obliquamente o vento
polidamente a medir os gestos
e o vago pensamento do filósofo doente.

Vazio regresso à chuva e tento.

Londres, maio de 2007.

MANHÃ



ondas preguiçosas desenrolam espumas
sobre areias perplexas com a intimidade do mar


o movimento desperta a sensualidade adormecida
atravessada pelo sol no limiar da manhã


[neva em Londres e as ruas brancas estão vazias]

Londres,saudade do Rio em pleno inverno 2007

FLORES



flores não florescem no frio
passado o tempo da esperança
florirão?

Londres, janeiro de 2007.

IS THERE HONEY STILL?



Nunca sei se enfrento a realidade quando estou perto de partir
atraso o relógio para chegar a tempo

nada tem sentido velado
tudo parece muito claro

relógios não marcam horas no escuro

interrompo o que escrevo para clamar aos que a certeza toca
que não pertenço a nenhuma geração
mas encontro razões ocultas em cada coisa que vejo
nessa erma noite da dúvida

I look upon the sun
to see black upon my eyes
bewildered

os detalhes incomodam a paz que nunca tenho
onde termina a estrada?

aqui é dia e um sol tímido clareia a relva dourada
a chuva cai
tenho comigo a estrada que me obriga a olhar à frente
e ver o emaranhado das encruzilhadas
nós e o nó

o tempo esvai-se

time and time again
so I have to read it again
so I have not left
so I stay
I insist in staying
elusive

são tão breves os dias
são tão breves os anos...

que horas são?

parece tão clara a brisa...
e a névoa?

I have to read it again from the beginning
whispering through twisted lips

as decisões que não tomo

where there is peace
clouds adrift in clear sky

imagem de quem quer ver
para conhecer o sossego no desassossego
de encontrar o tempo

I should find it. Strange is to imagine
that I have to leave
to stay prisoner of my self

medo do que deslembro da emboscada

em cada tronco esgalhado da excitante solidão

que importa se eu não publicar mais nada?
deixarei alguns amigos sonambúlicos com o que escrevi
e não entendi

a verdade é talvez não haver outro homem hesitante
que tanto indagasse da partida e da chegada
às dez horas da manhã

Is there honey still for tea?
[1]


Londres, janeiro de 2007.


[1] Rupert Brooke, The Old vicarage…

FIRENZE



“Però se alcuna volta io rido o canto/
follo perché io non ho se non questa una/
via da sfogare il mio acerbo pianto."//

[MACHIAVELLI, aprile 1513]


Se ao artista é lícito admirar a própria obra
o homem tem motivos que superam suas virtudes
para viver Florença e seus segredos
olhos baixados humilde diante da grandeza.

Como certezas morrem com os que as tiveram
a imortalidade vive
independente dos mortais que a fizeram.

Entre alma e emoção
recordo um prazer que me fala ao coração
e separa-o da alma para sobreviver nesta canção.


novembro de 2007.

LONDRES



Sigo a direção do vento
esta cantiga pobre de desejos quase é silêncio
rictos de melancolia
a vestir palavras no segredo que oculto.

Nada sei dizer no desconhecido fragmento
de que Londres é o novo tempo
exceto [não o nego] não ser este o lugar onde me vi
presciente no dia em que nasci.

Londres, março de 2007.

ROMA


Interrompi vida ao deixar Roma
e esperei que meu grito sufocado
os lábios secos de angústia
rompessem alhures em palavras
mas meus olhos escavaram a pedra dura
do puro desencanto.

Tudo é como ruínas em fundos desenganos
nas escuras catacumbas labirínticas
habitadas de mitos de bravura.

Caminhei porque sem caminho nada sei
horas sem fim
para encontrar meus olhos meus ouvidos
e a palavra
mas só lembrança restou no frio mármore
de colunas elegantes.

Bem sei há outra face que os deuses revelaram aos eleitos
dessa crença de que o homem é feito
de barro e alma no meu caso ressecados
a água é morta.

Nem se trata de crer em deuses no Cristo dos altares
o tempo é findo
e Roma eterna resta eterna.

Meu sorriso de saudade quando a lembro ilumina
a história verdadeira de um amor em minha vida.

Londres, novembro de 2006.

domingo, 25 de maio de 2008

PALHA



o mistério é o que nos resta
o passado inútil é parte da inocência com que a cor do mundo foi descrita
entre pragas e urtigas sobre a palha em fogo do que fomos

Londres, janeiro de 2007.

CLARO ESCURO



reconheço no claro o brilho desse lume
mas nada sei do escuro de onde veio

Londres, janeiro de 2007.

FEBRE



à margem de um verso anotei minha paixão
e era febre ainda ardente
em graus de ausência e de presença
na ânsia de sentir

juntos sossobramos no desesperado sentimento
desfeito no mistério do vil esquecimento

Londres, janeiro de 2007.

NAVEGAÇÃO



amei amigos vestido de ternura
para aprender a partilhar o mesmo barco
no mar da estima e desestima

senti sede de carinho carente de alegria
navegando pensamentos hoje memória
de um mundo perdido entre chuva e sol

esta realidade mescla vida e tédio
fatigada
sobrevivente no desejo
de viver a parte final na suposição de que há mar
sóbrio de razões
para ainda navegar


Londres, março de 2007.

ABISMO


o abismo está à beira de mim mas não o alcanço
como essência atrás do vento sopra esperança e alguns suspiros

nele um grito é só um pensamento

o eco são tristezas

acima olhos sussurrantes como vidros
desfloram almas
enquanto desço por uma corda rente à pedra
e claridades brancas põem a nu a solidão

diante do desconhecido peço tempo
para entender a divindade
mas tenho medo do que sou de costas para a noite
onde o próprio Deus na realidade hesita

resta pouco roucos sons em outros planos
de um desejo superado de outra solidão
além de mim em tempo transtornado
o abismo não consente


Londres, março de 2007/revisto em maio de 2008.

DESVAIRO


[à minha idade provecta]

sonhei que sonhava descuidando os anos
nenhuma estranheza em caminhos naturais e calmos
onde conheci desejos encantados na surpresa do ocaso

sonhei olhar o passado

no horizonte onde descobri o sentimento
como quem conhece ilusão desilusão e fado

sonhei a poeira do sol sob orvalho
sonhei um novo universo
verde no inverno quando nascem flores
e almas descobrem o sexo

sonhei que sonhava palavras sob luzes paradas
de um segredo aberto no prazer estranho ao mundo
de um lentíssimo incêndio

sonhei a ânsia de reaver o tempo


Roma, março de 2003/revisto em Londres, maio de 2008.

Villa Lobos - DEVANEIO

a minha mãe

boneca de pano

o piano entoa o canto de minha terra
no riso da criança sem nome
como boneca feita de pano

desterrado
essa música lembra o que amo

bonecas da minha gente
falam aos olhos do mundo
como céu antigo de sol

esta estrada musical fere

abstrata gente a olhar
nossas lendas a natureza e o mar

cirandas de afetos vividos
roda tortuosa em sons que convidam
a não morrer nos meus sentidos

essa balada é som primeiro de vida



Roma, março de 2003/revisto em Londres, maio de 2008.

sábado, 24 de maio de 2008

CHOPIN




o noturno afaga a ilusão do sonho ido
persegue meus segredos
em si maior
notas perdidas enternecem meus ouvidos


em processional grandeza a música é chama


Roma, fevereiro de 2003/revisto em Londres, maio de 2008.

ALEGORIA



[en una aburrida sesión del Codex Alimentarius]

palabras rituales


el alegorico vence el sueño
y tu entre palomas blancas
llegaste como mancha entre papeles amarillos

tu traje era una flor marina
sobre la polución de mis deseos encubiertos
y tu eras mi primer amanecer…


Roma, julio de 2003

LUA


há um lugar no cair da noite quando a lua
me traz a voz calma
do mistério

tudo começa às seis horas do entardecer
a cirandar seus cantos

menina dá-me uma rosa
rosa faze o botão…

à sombra do dia vem o luar
rente ao chão
onde o sol fora a razão
*
[tom distante
de um mozart hesitante]
espalhados
a calçada de buracos os brinquedos quebrados
de tanto rodar [cansado] o pião
e a tarde
pressentindo gerânios
camélias
as flores amarelas da imaginação

sobre o muro
o girar dos girassóis

este poema é saudade
no mistério do entardecer
como a lua cada dia
eterna em seu flutuar


Roma, 28 de janeiro de 2006/revisto em Londres em maio de 2008.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

MACH is MO



idéiasquenãosãominhas
(mach is modis farça do)

manei rade diz erco mum aoutrosho mens
mulhe res mu lher
esahaaha mul
her espen samm ui tome nos.

nyc, abril de 2001

CAVALOS [divertimento]

cavalos galopam velozes velozes galopam cavalos galopam cavalos velozes galopam velozes cavalos
cavalos velozes galopam

galopamgalopamgalopam
cavalosca
va
loscavalos

cavalosgalopamcavalosgalopam

sonham cavalos de meus sonhos
sonham sonhos de cavalos
galopam velozes


NYC, agosto de 2000.

PERIGO




o perigoso é viver
sem vida não há perigo sem risco nem mesmo há vida
o risco é o perigo o risco está em viver


NYC, setembro de 1999/revisto em Londres, maio de 2008.

DÚVIDA



A dúvida sempre me pareceu o princípio de tudo.
Tive certezas entretanto e pouco errei nelas.
O tempo passou e minhas certezas, todas elas, transformaram-se no que vejo qual dúvidas fora do tempo,
justo no tempo em que tudo são dívidas do fim da vida, último alento.


NYC, junho de 1999.

POESIA



também a poesia é filha do mistério
vive de mantras
em que metáfora ritmo ou rima
são orações de um culto pagão
onde a beleza é necessidade
de que o fundamento é o mundo.

Não se espantem com meus conceitos
como o diabo de Pessoa vivo de símbolos
nada devo à ciência nem articulo razões
empenho a alma e talvez o coração
como qualquer poeta que sente com o pensamento
mas não crio
os seres [vários] que trago comigo.


Furto-me ao convencional aristotélico
perco-me na eloquência dos silêncios
que me povoam o pensamento
fustigam-me o sentimento
com aspirações e desejos
fadados a explodir como poema.

Assim o poeta é um velho adolescente
vive de lembranças às vezes tristes
sobre o anoitecer
mas agudiza a memória nas tardes
de muitos sóis
a preceder a suavidade das noites

lugar de todos os sonhos
contraditoriamente
a lhe trazer alegria.

Ora, não sou a verdade
sou o poeta
na tentativa de ver sempre claro
os contrastes [que] são o sal da vida
o amanhecer [que] é cada dia
e cada dia é poesia.


Londres, maio de 2008

segunda-feira, 19 de maio de 2008

A VOZ DO PAI


de um soneto de Borges

o tempo no passado está presente
como a chuva que é passado quando cai

e cria em seu compasso
nascer e renascer
viver e reviver

assim ouço irrepetível a voz do pai
que sempre esteve e permanece como pedra
em verso incertamente
pedra sobre pedra
na alma na memória na vontade
e em nosso pensamento
certamente

Londres, maio de 2008

domingo, 18 de maio de 2008

E-MAIL


a alguém que sentiu minha poesia

Para quem acabo de descobrir para sempre
meu segredo caminha para onde moram os sonhos
e os sonhos aonde terei paz
no que hei de ser
sob a tutela do coração que me cura a alma
o entendimento que me confessa jovem
mais oculto do que mesmo sou.

Londres, 18 de maio de 2008

BRANCO




a nostalgia das folhas que decaem douradas
sob o silêncio e o vento frio
traz o branco

vem a saudade dos anos que se perdem
nas cores mutantes
de instantes que já foram vida


Londres, novembro de 2007.

LUZ DO MUNDO




Se aqui de Londres a razão me serve para esfriar a emoção
e deixar de ser densa alegria
o mundo torna-se sonho do que está em volta
inteiro acima da verdade
na memória sumarento a extrair luz e calor do pouco sol.

Londres, um domingo de março de 2008.


FERNANDO PESSOA



não ha quem não se debruce à janela para admirar os últimos raios do sol
já vermelhos contra o jogo de sombra e luz que reaparecerá em sonho
atravessado pelo segredo deste verso
não ha barreiras nem da ilusão a perturbar-me o olhar
o corpo regressa embebido de vida ao ofício do mundo
consciente de Ser no universo.

Londres metafísica, maio de 2008.

RENASCIMENTO




Esperei o poente para entender crepúsculo, não a escuridão
mas momento em que a luz deixou de ofuscar
para ser mistério de compreender a eucaristia
de meu corpo e sangue como vida

não abdiquei da luz mas a mudei de lugar intimamente
para fazê-la o limiar de outro nascer.

Londres, maio de 2008.