quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

METRO DA BARRA




pois é 
não estou só
tenho comigo minha consciência
tenho visão tato e paixão
tudo isso em coexistência
pacífica
com momentos de reflexão

a quietude não é silêncio
ajuda no passeio de mim comigo mesmo
sem projeto sem programa
aposentado
de pijama ou de pantufas
nu

não discuto o absoluto
parece que existe
no radicalismo dos narcisistas malignos
onde não há poesia
mas ingratidão quanto à vida que viveu

tudo é real
como as vozes da nona sinfonia de Beethoven
ou o segundo concerto de Mahler
ou o samba de uma nota só
de Tom

o silêncio brota das profundezas da mente
quieto como sói
e vai longe como o metrô da Barra
mas não chega 
para
no meio do caminho
onde há uma pedra

Rio de Janeiro, fevereiro de 2017







terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

DÚVIDA CERTA







fiz de mim o que quis
deixei de fazer o que não quis
tenho sido assim
às vezes calo
às vezes finjo
e a cada vez sou alegre e triste
nem por dentro nem por fora
a indecisão

tal seria um camaleão
verde no verde
vermelho no carmim
só não sei se o que fiz de mim
tem esse tipo por imagem
disputando quem de fato sou

nada espero mas o real
hoje como ontem
e um futuro incerto
amando nunca capaz
de odiar as cores dos jardins

fiel sempre ao real
construo o momento dado
e agora sou feliz
e sou quem sou
impreciso em busca do preciso
psicologicamente são
loucamente fora de mim

nessa busca  mesmo de meu eu
espero só o que existe
e agora existo
ou não

Rio de janeiro, fevereiro de 2017

www.poemasinconjuntos.com.br

  

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

P'RA QUE VOAR BORBOLETA?







não voes já borboleta
tem ares de não voar
ninguém te veio buscar
há muito tempo a tarde
avermelha o meu mar
que à noite empresta a prata
da superfície lunar


lá na curva distante
ainda há muitos instantes
que necessitas viver
nem tenhas pressa demais
nem tarde deves chegar
tens a chave da vida
não a percas cuidado 
mantém as asas ativas
azuis
para o mundo encantar

sou eu o falso poeta

que se põe a cantar
a beleza de teus olhos
que me fazem enxergar
a terra florestas o mar
e a leveza do ar
a gente que me rodeia
e o amor que me faz inda amar

descansa um tempo 

espera
deixa o tempo passar
ainda estou na janela
e nela quero ficar
não voes já borboleta
há hálitos por respirar
o fresco perfume da brisa
as peles que posso tocar

não voes já borboleta

ainda quero ficar...

São Paulo, 12 de janeiro de 2017

  

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

NU





hoje é presente
o futuro será amanhã
e o sol brilhará
sem que eu mova uma palha

estou nu diante do inevitável
há setenta e seis anos 
felizes

nenhum mal
sou apenas mais um
sujeito a essa rotina

ou não

São Paulo, 11 de janeiro de 2017

domingo, 1 de janeiro de 2017

"REVEILLONNER"



não canto o ano porque vivo o dia
sucessão de outros dias

antes vivê-los assim
instantes
sem perder a esperança

o ano que entra não sucede o que sai
um fenômeno sideral

como ondas que rolam sobre areia
somos sempre nós mesmos
diferentes na intensidade

diante de mim tenho o horizonte
e cá bem perto minha janela
daqui vejo a realidade

já por lá toda magia
do inconsciente que sonha

o ano passa qual nuvem ligeira 
por um momento atormenta minha alma
mas nem o vejo ao romper o novo dia

o sol no alto me ilumina
glória em vida

o que durmo sou quem passa
mas vivo cada dia a alegria

ontem não existe
finjo o que hoje sou
só no futuro há fantasia

e assim penso e assim vivo
o que me é dado é meu fado
o que não é meu não será
reservo-me para a viagem final 

"...tutto il passato in un punto
[...] non turberà suono alcuno..." *

"atrás não torno [...] só há lugar no futuro..."**


* variante de Eugenio Montale (Quasi una fantasia)
** variante minha, inspirada em Ricardo Reis (Fernando Pessoa)

Rio de Janeiro, 01 de janeiro de 2017





domingo, 25 de dezembro de 2016

O TEMPO



é azul o mar que vejo da janela 
reina a paz em suas ondas preguiçosas
na indecisão de seu silêncio

uma doçura inquieta  em minha vida incerta
escuta-lhe o sussurro manso
supersticioso a trair os meus segredos
indiferente à inquietude do presente

é outro o azul do céu de gaivotas brancas
onde habitam deuses 
promovendo cultos e orações em nosso peito
nas quais palpita o impreciso do futuro
e vive alerta o aceso da esperança

falta pouco sinto o tempo
a esgotar a seiva que circula dissonante
no bater de um ritmo hesitante
a soprar o vento

foi-se a juventude bela
soprada pela brisa constante e insistente 
esqueço a cada instante a alegria dela

é um novo tempo que não canto
por ser velho e cinza o desencanto

soa forte cada dia o presságio de outros tempos
armadilha da ilusão
que é a vida

Rio de Janeiro, 25 de dezembro de 2016

sábado, 24 de dezembro de 2016

IMPROMPTUS


aos amigos, neste Natal, via Lauro Moreira


da sua presença e do espírito em festa
tiro de improviso a frase incerta
e nem melhor nem mais certa
será a lembrança do vil esquecimento

não mudou o Natal sempre fui eu
descrente mas supersticioso prego 
o amor e a paz guias supremos
"que ora se separam ora se ligam"*

não repete a vida duas vezes
a alegria e o pranto
iguais na presença e na saudade

a realidade existe o virtual persiste  
a perplexidade domina o pobre crente
mas o coração insiste e lembra amigos

* Eugenio Montale

Rio de Janeiro, 24 de dezembro de 2016