quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

CLAMOR A UM DEUS








não consigo sorrir
acordo cansado do mundo
sobrevivo ao sentimento de dor
onde o amor desapareceu

se me vejo humano e creio em deus
porque atolar-me no pesadelo da destruição

enquanto a carne se decompõe em tenebrosos
vermes de percepção?

socorro!

cada vez menos claro o som da voz humana
não sorri

onde estás que não respondes
aos ecos e gritos
de vidas desconhecidas
famintas
desgrenhadas

aflitas

por onde andas?

falta um deus no derrotado Haiti

Rio, janeiro de 2010



quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

INDIGNAÇÃO [UM ARROUBO]




[da leitura dos jornais de hoje]


bem...um ser humano é um ser humano
dele não me aparto
sou um
até não nego

mas se não me aproximo
nada quero negar
desumano

incauto ego
fujo só do destino
que me entregou seres humanos

desprezíveis
conhecidos
eleitos
diplomados
mal amados
e por tanto tempo fui cego

instrumento de uma República ideal
exposta às sanhas
e corroída nas entranhas
hoje o desengano

[esperanças e ambições?]

mas guardei princípios
no meu barco abandonado

triste tudo
presos que somos da inércia
angustiados cidadãos
de nenhuma ação

triste país

acorda!

Rio, janeiro de 2010 [ano eleitoral]



terça-feira, 26 de janeiro de 2010

ANGÚSTIA







o que temos que não sabemos
tão certo
tua tristeza
teu amor
tua alegria
talvez um verso

que temos
que procuramos
tem tanto brilho
a tua dor
é tão sem luz a luz que vemos

o que temos que nem nos vemos
tomando por certo
mesmo este verso?

se temos qualquer caminho
o tempo não nos dá tempo
talvez um verso
não seja certo

se temos não o sabemos
e não procuro
é obscuro
à pouca luz
nesta penumbra

quando queremos
sobrevivemos
ao som do vento
ao fogo extinto
ao mar deserto
que nem eu canto
neste meu verso

quando vivemos
nem o sabemos


Rio, janeiro de 2010



segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

RECOLLECTION







I

a borboleta mais leve que o ar

navega o vento da frente pra trás

NYC, dezembro de 2001.


II


brilha a última estrela

murmura a pedra o canto d’água

abrem ao sol a pouco e pouco

os fios da emoção

saudade imprecisa

dessa manhã que balança à brisa e passa

Roma, dezembro de 2003.


III


quisera

mover-me no espaço

pousar em árvores

sobrevoar o caminho

entre o que sinto e o que penso

como vento

pássaro

Roma, dezembro de 2003.


IV


meada que perdeu o fio

enrosco-me em torno do nada

NYC, dezembro de 2001.


V


do que lembro me esqueço

quero falar mas não posso

NYC, dezembro de 2001.


VI


estava eu em meio de achados

impacientes por não serem encontrados

entre perdidos mal-amados

não atinei por acaso procurando

a ilusão nem mesmo encontrei

o outro que era eu no achado que perdi

NYC, junho de 2002.


VII


teimo em ficar não quis estar não pude ir

NYC, maio de 2001.


VIII


sou cativo de mim e não me entendo

eu aqui dentro a paisagem fora

um vago desejo de saber quem sou

se louco avanço deixo-me atrás

se sonho à frente

esqueço de sonhar.

Roma, dezembro de 2003.


IX


a palavra ultrapassada

é memória evaporada

au delà des mots

em seca lágrima

sou a última gota sem pena

NYC/Roma, julho de 2001/setembro de 2003.


X


sou querer que nada quer

sem saber se posso ser

sou pouco eu sou eu

sozinho

em mim sem me ser meu

NYC, Roma, setembro de 2001, setembro de 2003.




domingo, 24 de janeiro de 2010

VIVER






I

o despertar de desejos prenuncia a vida

II

a esperança deles nos mantém

III

queremos o mundo qual nos vem

IV

tristezas se mal queremos
alegrias se bem fazemos

V

alguns vivendo não vivem
outros querendo não têm

VI

tudo muda e o tempo foge
só aprendemos vivendo

VII

alegre é a cor que vemos
melhor não pode ser
que se cores não temos
talvez melhor perecer

cores são tudo
sentir pensar até mesmo sofrer
coisas e fatos o mundo
melhor é melhor ser

VIII

um ou outro verso
pode mostrar minha dor
tão bem que dor parece
tudo que em mim é amor

IX

meus olhos lagrimas têm
choram por bem querer
nunca choram por tristezas
choram por querer bem

X

amo a intimidade de ver
sinto a intimidade de ser
que tudo me ajuda a sofrer
a alegria de viver

Rio, janeiro de 2010





sábado, 23 de janeiro de 2010

TANTA VIDA




[ Cf. Longitudes - http:// nydiabonetti.blogspot.com ]


diante de meus olhos
tanta vida

longe de meus olhos
nada é alheio a mim
além de meus olhos o mistério
de a vida ser assim

Rio, janeiro de 2010



CONSTATAÇÕES






não me engana a morte
nem me tenta a sorte
e sendo isso tão certo
vivo de muito sentir

diante do espelho embaçado
vejo quem deve morrer
mas vive por muito querer

porque penei nem sei
peno sem razão
só me fere o coração

mas tenho medo confesso
de amar o que desconheço
obrigado pelo destino
e pela sorte ao avesso
começo por onde termino
termino quando começo

vivo sem desenganos
conheço todos os danos
nasci para amar viver
para renascer e morrer

não tenho horror de morrer
o que temo é deixar de viver

Rio, janeiro de 2010