sábado, 28 de julho de 2012

UM DIA PARTI


e minha ausência
fez-me voltar no tempo
quando a saudade era outra
e tudo estava por vir


e minha ausência
fez-me tornar ao passado
quando o futuro era outro
e o destino era fado 


ah como foi bom sair de mim mesmo
e reviver nesse sonho
um tempo que já vivi


e esse sumário é memória
do dia quando sem o saber
assim de repente morri


Rio, julho de 2012.



ORAÇÃO



se a vida é como é
estou tranquilo
na lembrança do que me faz feliz

estou confiante mas temeroso
dos sinais de um passado
que não me pertenceu

abandona-me à tristeza o triste recordar
todo pecado  
que não foi meu 
e no entanto conheço o que passou

a memória traz à lembrança

infelizes 
insensatos a errar irregulares
no erro de ensinar 
a distorção
de uma falsa ética da atração

ameaçados 
os que sucumbiram oram comigo no presente 
pelo futuro

peço-lhes a cura e a conversão


Rio, julho de 2012.




quarta-feira, 25 de julho de 2012

PAISAGENS DE PASSAGEM


ah ser poeta ou pretender
sem forma sem fundo
arrítmico assistêmico
missil balístico sem direção


entre o que sou e o que pretendi
pouco fiz mas acreditei
no que passou


essa marca ou impressão
com meus olhos vi
desejo e ambição
paisagens em passagens
e mais nada


Rio, julho de 2012.









sábado, 21 de julho de 2012

DESEJO TARDIO



incompreendido desejo tardio
és centelha do amor impossível
experimentado na solidão
que o tempo impede
mas persiste no coração


rememoro o tempo viril
da firmeza e toque de seda
do destempero jovem
prenunciando o gozo
incêndio antes do adormecer


angústia exasperada
que adivinhei em sonho
da decadência da espada
sob relâmpagos iluminando a estrada
que se aproxima do fim

Rio, julho de 2012




quinta-feira, 19 de julho de 2012

PASSADO



inútil pensar no que foi
já não é


Rio, julho de 2012.





O MELHOR AMIGO

 ...that marble circle where the oldest bard is as the young... 
[Oscar Wilde]

em sonho identifiquei o amigo
por toda a vida caminhei sem ele
mas reinventei o caminho
e retomei meu tempo
para redescobrir meus espaços


ah de quanta solidão me lembrei



o melhor amigo existe

ao despertar
idealmente

ao adormecer
concretamente



só em sonho me vi 
suspendendo o futuro
ignorando o passado
para viver o presente


como as estações do ano
renovo-me
intensamente




Rio, julho de 2012.









domingo, 15 de julho de 2012

BALADA




tenho tudo
tenho a linguagem
tenho os sons e as palavras
tenho uma ideia do belo
e sei falar da beleza

de manhã abro a janela
vejo quem passa
muitos são os que vejo
nem sempre são os que quero
mas os quero muitos
são minha gente


o mar bate n'areia
suave sussurra segredos
provavelmente vindos da África
essa África de que quase nada sabemos
mas veio de lá nossa gente
negra branca mulata
samba orixás e a maravilha das cores

nesta hora sou de mim sacerdote
médium transcendendo o real
sou aquele personagem
capaz de se encantar com imagens
que apenas percebo passar

sou o “infinito íntimo” de que fala o poeta
na dimensão do humano
e não sou estranho
quando me sinto sonhando
sonhos que não vivi
de coisas que entretanto já vi

hoje ao abrir a janela
ondulava plácido o mar
verde escuro claro e grisalho
no seu outono invernal
festa das gaivotas

presente era toda gente
do passado que me saudava
de um futuro que não pressinto
neste meu momento íntimo
alma na circunstância

debruço-me sobre mim
para gozar o momento
e o que minha alma sente
é parte de meu testamento


Rio, julho de 2012.